RESUMO
Redes Sinérgicas (RS) gerou um novo conceito como plataforma tecnológica inovadora, que surgiu da motivação de um sistema smart grid óptico para monitoramento de condutores rompidos em linhas aéreas. RS foi o termo estabelecido para essa tecnologia pelo significado da palavra sinergia, que é a associação concomitante de vários dispositivos desempenhando determinadas funções, que contribuem para uma ação coordenada (Smart Grid). Em outras palavras, isso significa a soma dos esforços promovidos por um sistema para o mesmo fim (Eficiência Operacional). O conceito e sua plataforma foram desenvolvidos e estão em operação experimental real no Brasil, desde 2014. O objetivo desse artigo, será apresentar o desenvolvimento desse conceito, aplicado nas redes de distribuição e transmissão de energia elétrica, por meio de resultados obtidos em Projetos de P&D da Aneel, que a Cemig foi a principal financiadora.
introdução
A infraestrutura de redes de distribuição está com os postes sobrecarregados devido à coexistência de diversas redes, como: telecomunicações, monitoramento de segurança, operação e controle de tráfego, dentre outros. Do ponto de vista das boas práticas, essas estruturas são instaladas de forma inadequada, comprometendo a confiabilidade e o uso para o Smart Grid. Com o uso da rede sinérgica nas redes de distribuição, haverá uma redução na quantidade de cabos nos postes, uma vez que as fibras ópticas estarão integradas aos cabos de energia, reduzindo poluição visual, acidentes e esforços mecânicos nos postes. Já para as linhas de transmissão, o conceito de RS pode ser utilizado como uma maneira de se ter um meio de comunicação (fibra óptica) confiável e disponível para diversos usos, como: sensoriamento; automação; comunicação entre subestações etc.
Este artigo apresenta a RS, que é um conceito que foi desenvolvido pelo CPQD e Cemig há cerca de 9 anos. O conceito propõe a utilização de fibras ópticas integrada aos cabos condutores de transmissão e distribuição de energia elétrica para atender as demandas de comunicação, sensoriamento e automação das redes inteligentes (Smart Grid). As redes sinérgicas permitem uma melhor supervisão e controle dos ativos das redes elétricas, além de garantir a qualidade no fornecimento de energia e o compartilhamento de fibras ópticas para sistemas de telecomunicações de banda larga.
Aplicações de redes sinérgicas
Linhas aéreas de transmissão (LT) de até 138 kv
A primeira aplicação de redes sinérgicas foi no âmbito do projeto de P&D Aneel Cemig D520, de 2016 (1), que teve como objetivo o desenvolvimento de um sistema óptico para monitorar a integridade física de cabos condutores de linhas de transmissão aéreas utilizando sensoriamento óptico. O sistema foi baseado na implantação do protótipo de cabo óptico Linnet do tipo OPPC (OPtical Phase Cable) e de Isoladores especiais, com as fibras ópticas encaminhadas através dos seus núcleos, em ambas as extremidades da linha. A Figura 1 apresenta o Isolador eletro óptico utilizado para realizar as emendas e derivações das fibras ópticas dos cabos OPPC, já a Figura 2, apresenta a aplicação do conceito RS em LT de 138 kV.
Figura 1 – Isolador óptico elétrico 138 kV.
Figura 2 – Aplicação do conceito RS em LT de 138 kV.
Redes de distribuição de média tensão de até 35 kv:
O desenvolvimento da aplicação da RS na média tensão ocorreu no âmbito dos projetos de P&D Aneel Cemig D566 (2) e D613 (3), e também houve apoio da indústria nacional, como a Furukawa, por meio do financiamento Embrapii, que forneceu a primeira geração dos condutores ópticos de distribuição de energia com fibras ópticas integradas (denominado OPDC), e da Balestro Isoladores Elétricos, que juntamente com o CPQD, desenvolveu a Mufla Óptica e a Caixa de Emenda Suportada por Bucha Isoladora para a Classe de até 35 kV, que possibilitam o acesso às fibras ópticas para realização de emendas, derivações e terminações.
As conexões elétricas nos cabos OPDC podem ser realizadas utilizando grampos paralelos ou conectores tipo cunha, porém, somente os que são aplicados com dispositivos de prensagem. Os conectores devem ser criteriosamente especificados e instalados para evitar deformações excessivas no núcleo dos cabos OPDC e, consequentemente, comprometer o desempenho das fibras ópticas. Até o momento existem 3 tipos diferentes de cabos OPDC: os cabos mensageiros, os cabos OPDC fase protegidos, para serem usados na rede compacta, e os cabos OPDC fase nus, podendo ser eles CAA ou CA, todos eles com uma capacidade máxima de até 48 fibras ópticas. A Figura 3 apresenta os elementos dessa aplicação.
Figura 3 – Elementos da RS de média tensão: (a) Caixa de Emenda Suportada por Isolador, (b) Mufla Óptica e (c) Cabo condutor com fibras ópticas integradas (OPDC)
Redes de distribuição de baixa tensão:
A Rede Sinérgica para baixa tensão, diferente das outras duas aplicações, não é baseada na utilização de um cabo condutor com fibras ópticas integradas. Ela é baseada na utilização de um cabo multiplexado isolado (convencional) contendo duas ou três fases, porém adicionalmente aos cabos é encordoado também um ou mais microduto(s), que possibilitam a instalação de um ou mais cabos ópticos, logo após a sua instalação, ou no futuro mais distante, conforme apresentado na Figura 4.
A agregação do microduto ao cabo multiplexado otimiza a infraestrutura das redes aéreas, pois unifica, em um único caminho e espaço, a rede de distribuição de energia elétrica de baixa tensão e a rede óptica de telecomunicações.
O cabo multiplexado com o microduto viabiliza a construção de redes ópticas com grande capacidade de fibras ópticas, definida em função da relação entre o diâmetro interno do microduto e do diâmetro externo do cabo óptico. Por exemplo, nem um microduto de aproximadamente 10 mm de diâmetro interno, é possível lançar um cabo de até 144 fibras ópticas utilizando a tecnologia de microcabos.
A instalação/lançamento dos cabos multiplexados, com as respectivas terminações dos microdutos, deve ser realizada pelos técnicos da distribuidora de energia, mas as demais operações relativas ao sistema óptico poderão ser realizadas pelas empresas de telecomunicações em um outro momento, não atrasando o religamento da rede elétrica.
Figura 4 – Elementos da RS de baixa tensão: (a) Cabo Multiplexado Sinérgico e (b) Caixa de emenda óptica.
Testes de campo
Para validar as diversas aplicações das “Redes Sinérgicas” foram implantadas redes piloto no campus da UniverCemig, em Sete Lagoas – MG. Para a Aplicação em alta tensão, foi instalado um trecho de rede de 138 kV utilizando o cabo OPPC Linnet. Nessa aplicação, as fibras ópticas do cabo foram utilizadas para monitorar a integridade dos cabos em vãos críticos, concomitantemente com um sistema CWDM, para comunicação em banda larga, conforme apresentado na Figura 5.
Figura 5 – Construção da RS em LT para testes na UniverCemig: (a) realização das emendas na base do isolador óptico e elétrico 138 kV, (b) instalação do arranjo com o condutor OPPC e (c) rack com as terminações das fibras ópticas e os equipamentos da rede óptica, CWDM e OTDR, na central de controle.
Foi implantada também a rede sinérgica de média tensão na Classe de 13,8 kV. Nessa implantação, foram utilizados cabos OPDC protegidos, nus e mensageiros, em trechos de redes de distribuição compacta e convencional. Para realizar as terminações e emendas das fibras ópticas, foram utilizadas muflas ópticas, que são isoladores elétricos especiais que permitem a passagem da fibra óptica em seu interior. Os detalhes dessa implantação são apresentados na Figura 6.
Figura 6 – Detalhes da implantação da RS de Média Tensão 13,8 kV.
No mesmo trecho onde foi instalada a rede sinérgica de média tensão, também foi instalada uma rede sinérgica de baixa tensão, conforme é apresentado na Figura 7.
Figura 7 – Detalhes da implantação da RS de baixa tensão: (a) Puxamento do cabo multiplexado, (b) passagem do cabo óptico e (c) realização das emendas ópticas.
Aplicações práticas
Na UniverCemig, onde foi instalada a primeira Rede Sinérgica Piloto, para testar e potencializar os resultados dos projetos envolvidos, foram instaladas algumas aplicações utilizando as fibras ópticas da RS, tais como: câmeras de vídeo monitoramento; sensores de qualidade de energia (4); access point; sistema de monitoramento óptico de intrusões; denominado Fence Lite; e um sistema de supervisão da rede óptica. A Figura 8 apresenta algumas dessas aplicações.
Figura 8 – (a) Sistema de Monitoramento de Perímetro – (b) Sensor Óptico de Qualidade de Energia – (c) Câmera de vídeo monitoramento – (d) SRO – sistema de supervisão óptica.
Além das aplicações instaladas na UniverCemig, nos últimos 15 anos, a Cemig, em parceria com CPQD, têm investido em diversos projetos de P&D, na área de monitoramento e controle de ativos de T&D, a fim de modernizar esses ativos, com uso de tecnologia óptica, como elemento sensor e como elemento de transmissão de dados (1). A tabela 1 apresenta algumas das possibilidades de uso do conceito Redes Sinérgicas em Linhas de Transmissão, e a Figura 9, apresenta a representação didática dessas aplicações.
- – Novas aplicações do conceito RS em LT como uma infraestrtura compartilhada
Elemento | Função Primária | Função Secundária |
cabo OPGW, cabo neutro e cabo guarda | Telecomunicações em banda larga (backbone)Redundância de canais para teleproteçãoInfraestrutura de rede inteligenteIntranet ou Internet(redes internas ou externas)Redes SmartGrids | IoT e Indústria 4.0Sensoreamento pontual ou distribuído(tensão, temperatura e vibração)Integridade física do condutor (1)Vídeo MonitoramentoDetecção de fumaça e fogoMedição de Ruído ElétricoAutomação Rede Distribuição até o AMI |
condutores – OPPC e OPDC | ||
Isolador óptico e elétrico, muflas opticas e caixa de emendas | ||
Partes Estruturais: Torres, Postes e Fundações |
Figura 9 – Representação de uma aplicação do conceito RS com suas funções agregadas.
Desenvolvimentos futuros
A presença de fibras ópticas juntas aos condutores e cabos de energia elétrica, abre outras possibilidades, talvez ainda não imaginadas, principalmente em gestão de ativos. Mas para isso, é necessário ter o conceito RS em escala industrial como opção e padrão dos novos projetos. Assim, o conceito RS inovou quando os meios de comunicação e os sensores estão diretamente conectados da alta tensão até na baixa tensão. No futuro próximo, estima-se que todos os equipamentos de GTD possam ser projetados e construídos com fibras ópticas integradas aos seus elementos internos, permitindo a sua integração à RS. Dessa forma, redes e equipamentos estarão todos interconectados em uma grande rede smart grid óptica e cabeada, sendo possível realizar a mudança tecnológica requerida para acelerar a transição energética em curso.
Conclusão
Este artigo mostrou o conceito de Redes Sinérgicas e foram apresentados os elementos desenvolvidos para as diversas aplicações. A RS, nas suas diferentes aplicações, está instalada na UniverCemig, há mais de 9 anos, sem nenhum registro de defeito até então, mostrando que este tipo de solução é robusta e confiável para ser instalada no ambiente das redes elétricas inteligentes.
A presença de fibras ópticas, juntas aos condutores de energia elétrica, abre novas oportunidades para as redes de distribuição e transmissão, viabilizando diferentes aplicações, como compartilhamento de infraestrutura, com redução drástica da poluição visual e de ruído de radiofrequência nos postes, melhoria do monitoramento e automação das redes, além de outras tantas possibilidades a serem desenvolvidas.
*Carlos Alexandre do Nascimento é doutor em Engenharia Elétrica pela UFMG (2009), com graduação e mestrado em engenharia mecânica. Atualmente, é engenheiro de Engenharia de Transmissão da Cemig GT.
*Eduardo Ferreira da Costa é doutorado em Engenharia Elétrica pela Universidade Estadual de Campinas. Atualmente é engenheiro da Fundação Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações. Tem atuado como pesquisador e coordenador de projetos de P&D para o setor elétrico.
*Bruno Nogueira Aires é graduado em engenharia de telecomunicações e atua na Fundação CPqD desde 2011. Trabalha também no laboratório de certificação de cabos ópticos e acessórios.
*João Batista Rosolem possui doutorado em Engenharia Elétrica pela Universidade de São Paulo. Atualmente é pesquisador do CPQD e líder técnico do laboratório LSMO (Laboratório de Sensoriamento e Monitoração Óptica) do CPQD.
- REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
- Nascimento, C.; Rosolem, J.; Hortencio, C.; Dini – VIII CITENEL – Costa do Sauípe, BA, de 17 a 19 de agosto de 2015. “Desenvolvimento de Sistema Óptico para Monitoração de Vãos Críticos e Transmissão de Dados de Telecom em LTs”;
- Nascimento, C.A.M., Penze, R.S., Floridia, C., Rosolem, J.B., Hortencio, C.A., Dini, D.C., Elias K. Tomiyama, E.K. Redes Sinérgicas: Uma nova concepção tecnológica para a integração de fibras ópticas e cabos condutores de energia elétrica; XI Simpósio de Automação de Sistemas Elétricos (SIMPASE); 16 a 19 de agosto 2015; Campinas-SP.
- E.F.Costa, et.al, AS REDES SINÉRGICAS PARA DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA – CONCEITO, DESENVOLVIMENTO E RESULTADOS, XXVI Seminário Nacional de Produção e Transmissão de Energia Elétrica (SNPTEE), 2022.
- Bassan, F., Rosolem, J.B., Floridia.C, Aires, B., Peres, R., Aprea, J., Nascimento, C.A.M, Fruett, F. Power-over-Fiber Smart Sensor Fully-Connected in a Hybrid Fiber/Power Distribution Cable; The 3rd Optical Wireless and Fiber Power Transmission Conference (OWPT2021); Online; Japan; Apr. 19 – 22, 2021.