Sintonizados com a demanda por uma gestão socialmente responsável, agenda ESG ganha cada vez mais relevância no ambiente corporativo
O início de um novo ano é uma das melhores épocas para buscarmos novidades sobre assuntos que refletem e influenciam diversos desafios contemporâneos da sociedade. É o caso daquelas três letrinhas famosas, verdadeiras protagonistas de inúmeras discussões dentro e fora de empresas e redes sociais. Calma, não estou prestes a trazer atualizações acerca de algum reality show badalado de televisão, mas sim sobre o tão discutido ESG – um acrônimo que tem se tornado sinônimo de responsabilidade corporativa e sustentabilidade no setor elétrico e além.
Do inglês, Environmental, Social and Governance (Ambiental, Social e Governança), o ESG transcendeu as barreiras do jargão corporativo, transformando-se em um guia fundamental para as práticas empresariais responsáveis. Cada uma dessas letras carrega consigo um peso único e altamente significativo. A dimensão ambiental refere-se ao comprometimento com práticas sustentáveis, busca pela eficiência energética e redução das pegadas de carbono. Já a dimensão social engloba questões relacionadas à diversidade, equidade e inclusão, assim como o engajamento com comunidades locais. Por fim, a dimensão de governança abrange a transparência nas operações, a ética nos negócios e a qualidade da gestão.
Desta forma, ao falarmos sobre ESG, não estamos nos limitando à apenas mais um selo empresarial que reflete uma conquista específica da companhia perante o mercado, mas sim, sobre um conjunto de princípios que orienta as empresas na construção de um impacto positivo tanto no âmbito ambiental, quanto social, ao mesmo tempo em que fortalece suas bases de governança interna.
“Revolução organizacional”
Para se ter uma ideia do avanço cada vez maior desta pauta, mal havíamos substituído o calendário esquecido no canto da mesa e a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) já estava concretizando uma medida estipulada no novo Regulamento Geral de Direitos do Consumidor de Serviços de Telecomunicações (RGC), aprovado no ano passado, que dá início a um Grupo de Trabalho (GT) para acompanhar as medidas adotadas pelas prestadoras, no que diz respeito às práticas ESG. Baseada nos instrumentos da Agenda 2030, da Organização das Nações Unidas (ONU), a portaria institui que o GT “definirá índices de critérios e desempenho para classificar as prestadoras de telecomunicações com base em suas ações relacionadas aos compromissos ESG”.
Evidentemente, tal paradigma está se tornando cada vez mais essencial também no setor elétrico, onde as empresas não apenas fornecem energia, mas assumem o compromisso de serem agentes de mudança positiva em suas comunidades e no mundo como um todo. Mas estamos, de fato, avançando nesta pauta? “Hoje vejo o conceito ESG como algo mais bem explorado e democratizado em termos de acesso às pessoas, mas quando começamos nossa jornada, ainda era um tema inovador que enfrentava as barreiras que toda revolução organizacional enfrenta quando chega – e não só falo aqui da nossa empresa, mas de todo o mercado.” A reflexão parte de Reno Bezerra, diretor Jurídico e coordenador do Comitê ESG da Itaipu Transformadores, empresa com 48 anos de operação ininterrupta.
O executivo conta que, para que os planos saíssem do papel e fossem efetivamente incorporados à cultura corporativa, houve a necessidade de persuadir os colaboradores sobre a relevância do ESG para a empresa, para a comunidade e para o desenvolvimento profissional e pessoal de cada um. “Começamos um trabalho de diálogos e estudos internos, e concluímos que havia a necessidade de harmonizar as nossas ações e construir uma equipe especialmente focada no tema. Foi quando, com o apoio dos sócios da empresa, criamos o comitê ESG, composto pelos times de RH, Meio Ambiente e Jurídico, passando a ter metas, KPI’s [Indicadores-Chave de Desempenho] e desenvolvimentos próprios, dando vida à pauta efetivamente falando.”
Atualmente, a Itaipu Transformadores conduz análises e auditorias internas e com stakeholders (pessoas, empresas ou instituições que têm algum tipo de interesse na gestão e nos resultados de um projeto ou organização), destacando-se por uma série de iniciativas sociais. Dentre elas, há o plantio de árvores em parceria com crianças e a elaboração de orientações e palestras direcionadas às colaboradoras, abordando o combate à violência contra a mulher durante o Agosto Lilás. Além disso, a empresa promove a caminhada “Passos que Transformam”, em comemoração ao Outubro Rosa e ao Novembro Azul, realiza doações ao Hospital de Amor de Barretos e apoia a cultura, sendo patrocinadora ouro do Festival dos Corais de Catanduva (FESCC) há uma década, entre outras ações relevantes para a comunidade, que já resultaram em premiações e na certificações ISO 9001, 14001 e 4500.
“Somos uma empresa signatária do Pacto Global da ONU desde 2017, sendo uma das pioneiras a abraçar os ideais das Nações Unidas aqui no Brasil, principalmente no meio da indústria do setor elétrico. Portanto, como aderentes do Pacto global, estamos comprometidos com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentáveis e, ano após ano, para oficializar o nosso comprometimento, enviamos à ONU nossa Comunicação de Progresso, que por sua vez é um relatório constando evidências documentais de que estamos seguindo a agenda ESG proposta”, conclui Reno Bezerra.
Indo além do “E”
Ao nos depararmos com o acrônimo ESG, é quase inevitável que palavras como “sustentabilidade”, “meio ambiente” e imagens sobre desmatamento ou degradação de biomas do planeta terra surjam em nossas mentes. Afinal, nesse cenário de urgência em adotar práticas que mitiguem as crescentes mudanças climáticas, a letra “E” se destaca como a protagonista dessa sopa de letrinhas. No entanto, o “Social” não é um mero coadjuvante na sigla. Sua presença vai além da estética da composição, sendo essencial para moldar as transformações almejadas.
Uma das empresas que reconheceu a importância das práticas ESG e abraçou uma série de práticas sustentáveis, foi o Grupo Gimi. “Internamente, aprimoramos e estamos implementando muitas políticas. Entre elas, uma que chamamos de ‘Acelera Gimi’, trata-se de um plano muito desafiador em que pretendemos, dentro de cinco anos, transformar a Gimi em uma das melhores empresas para se trabalhar na nossa região, que é o Alto Tietê, local com muitas multinacionais”, enfatiza o CEO do Grupo, Nunziante Graziano.
O gestor explica que, para alcançar esse objetivo ambicioso, a empresa está implementando uma série de medidas destinadas a aprimorar significativamente seu ambiente de trabalho. “Temos a preocupação com o bem-estar do colaborador, quando ele está aqui. Hoje a relação de trabalho não se resume apenas ao salário. É o plano de carreira, o bem-estar, o bom ambiente de trabalho, a infraestrutura do local, a alimentação adequada, é poder ter alguns minutos para si próprio.” Para ilustrar este último tópico, Graziano conta que a companhia desenvolveu as chamadas ‘áreas de descompressão’, local onde os funcionários podem se distrair com jogos como tênis de mesa, pebolim e bilhar, além de outras áreas de convivência com direito à guarda-sol no gramado e quiosques para socialização.
Determinado a manter um olhar atento não apenas para o seu ambiente interno, o Grupo Gimi também desenvolveu ações voltadas às comunidades ao seu entorno. “A comunidade onde estamos é muito carente e, por isso, apoiamos três grandes projetos. Dois deles visam a inclusão social de crianças e jovens através do esporte. Além de contribuir financeiramente com as iniciativas, também as apoiamos prestigiando os campeonatos. A direção e os colaboradores participam, e isso é muito interessante, porque integra o que é ‘endomarketing’ e as relações internas dos colaboradores com o mundo lá fora, mostrando o quão complicado ele é”, relata Nunziante. O terceiro projeto apoiado pela Gimi envolve um curso de formação básica em elétrica, no qual a empresa assume todos os custos relacionados ao ensino de cerca de 20 alunos.
Transformação sustentável
Voltando o olhar ao “E” da questão, ou seja, às ações adotadas pela empresa levando em consideração o impacto que ela causa no meio ambiente, Nunziante Graziano nos conta que todas as políticas da Gimi são baseadas no conceito da economia circular. “Este conceito nos diz que temos que prolongar ao máximo a vida útil de produtos e materiais, e quando não for mais possível mantê-los em operação, é preciso reclassificá-los, repotencializa-los ou reformá-los, de forma que este item volte a ter um ciclo de vida e não passe ao sucateamento. Nós engajamos toda a nossa cadeia de fornecedores e orientamos os nossos clientes de que o nosso processo é pautado nesse conceito”, afirma o CEO.
A descarbonização é outra vertente relevante da agenda ESG, processo que visa uma economia global com emissões reduzidas de carbono na atmosfera,pautada pela tão almejada neutralidade climática, por meio da transição energética. Recentemente, a gigante alemã Siemens publicou seu Relatório de Sustentabilidade para o exercício fiscal de 2023, apresentando um forte avanço em várias metas relacionadas à pauta ESG. Desde o ano-base de 2019, as emissões de CO₂ provenientes de suas próprias operações foram reduzidas pela metade. Além disso, mais de 90% dos negócios da empresa capacitam os clientes a promover um impacto positivo na sustentabilidade, uma vez que, de acordo com a companhia, as tecnologias da Siemens comercializadas no exercício fiscal de 2023 contribuirão para evitar aproximadamente 190 milhões de toneladas de emissões de CO₂, representando um aumento significativo de cerca de 24% em comparação ao ano anterior.
“Estamos efetivamente contribuindo para combater a mudança climática e impulsionando a transformação sustentável de nossos clientes e das economias. A tecnologia é a chave para um futuro sustentável, e são as pessoas que desenvolvem essa tecnologia. Para transformar com sucesso a sociedade e a economia, habilidades focadas em digitalização, tecnologia e sustentabilidade são fundamentais para enfrentar esse desafio”, afirmou Judith Wiese, Diretora Global de Pessoas e Sustentabilidade e membro do Board da Siemens AG, responsável pela empresa no Brasil.
Transparência como chave do sucesso
Talvez o menos citado do trio ESG, o “G”, referente à Governança, representa o pilar essencial que direciona as práticas éticas, transparência e responsabilidade corporativa de uma empresa. Uma governança robusta implica na implementação de estruturas decisórias claras, com a participação efetiva dos órgãos de administração. Empresas comprometidas com a boa governança buscam alinhar seus interesses com os de seus acionistas, garantindo a prestação de contas e a equidade nas operações. Além disso, promovem a diversidade e a inclusão em todos os níveis organizacionais, reconhecendo que a pluralidade de perspectivas enriquece a tomada de decisões.
A transparência em divulgar informações financeiras e não financeiras reforça o compromisso de construir uma base sólida de confiança com seus stakeholders. Empresas como a multinacional holandesa de iluminação Signify, por exemplo, monitoram regularmente as ações adotadas, e as tornam públicas através de um relatório anual, conforme explica o Customer Services Manager da Signify Brasil, Marcio Quintino. “Trata-se de um trabalho de longo prazo, feito através do desdobramento de objetivos e metas específicas (ambientais, econômicos, vendas, práticas de gestão, integridade, sociais, etc) por todas as organizações Signify mundo. Estes objetivos, metas e respectivos planos de ação são monitorados regularmente nas atividades comerciais e industriais, consolidados globalmente e os resultados divulgados anualmente.”
Em seus relatórios, a empresa oferece um panorama abrangente acerca de sua performance financeira, em escala global, ao longo do período analisado, incluindo detalhes sobre as remunerações concedidas aos seus colaboradores e executivos. A divulgação engloba não apenas a saúde financeira da organização, mas também proporciona um resumo detalhado da sua relação com investidores ao longo do ano. Adicionalmente, são apresentados insights sobre o gerenciamento proativo de riscos, demonstrando o compromisso da multinacional com a transparência e a eficácia em sua gestão corporativa.
Reportagem desenvolvida por Fernanda Pacheco.