Equidade de gênero e transição energética: um passo necessário para a eficiência no setor elétrico

O setor de energia no Brasil está passando por transformações profundas, impulsionadas pela transição energética. Este processo abrange não apenas a substituição de combustíveis fósseis por fontes renováveis, mas também a digitalização do setor elétrico, a descentralização da geração e a diversificação das fontes de energia e da força de trabalho. Nesse contexto, o Balanço Energético Nacional (BEN) 2024, que apresenta dados relativos ao ano de 2023, destaca um crescimento impressionante da energia produzida pelas usinas solares fotovoltaicas: de 3.461 GWh em 2018 para 50.633 GWh em 2023, um aumento de 14,63 vezes em apenas cinco anos. As projeções para o futuro são igualmente promissoras. De acordo com o Plano Decenal de Expansão de Energia 2030 (PDE 2030) da EPE, a capacidade instalada de energia solar no Brasil deverá triplicar na próxima década, consolidando-se como um dos pilares estratégicos da matriz energética nacional.

Hoje, a energia solar já representa 96,3% da geração distribuída no país1, com impacto direto na criação de empregos e oportunidades. Contudo, há um ponto que precisa ser enfrentado com urgência: o papel das mulheres nesse setor, a participação feminina não acompanha esse ritmo. De fato, há uma tendência de queda na representatividade das mulheres no setor.  Dados da Greener de 2024 mostram que 40% das empresas de energia solar não possuem sequer uma mulher em suas equipes, e apenas 7% das que contratam mulheres destinam-nas a áreas técnicas, como engenharia e instalação de sistemas. Essa sub-representação não apenas reflete desigualdades estruturais, mas também impede que o setor aproveite todo o seu potencial de inovação.

O Instituto Global McKinsey reforça essa relação em estudos que revelam que a diversidade de gênero está diretamente associada à lucratividade e à eficiência. Empresas com maior equilíbrio de gênero têm 15% mais chances de alcançar retornos financeiros acima da média de suas respectivas indústrias. Além disso, a inclusão feminina pode contribuir para um “dividendo de inovação”, trazendo soluções mais criativas e ampliação dos pontos de vista estratégicos.

Apesar dessas evidências, as barreiras enfrentadas pelas mulheres no setor de energia solar no Brasil são desafiadoras. Um estudo recente do C40 Cities Finance Facility, em parceria com a Rede Brasileira de Mulheres na Energia Solar e outras entidades, destacou que preconceito, falta de reconhecimento e machismo são os principais obstáculos enfrentados pelas mulheres. Isso reflete a necessidade de criar um ambiente mais inclusivo e respeitoso, não apenas para atrair mulheres para o setor, mas para garantir que elas permaneçam e prosperem nele.

A importância da equidade de gênero na transição energética também é reforçada pelo projeto “Energizando a Equidade: Meninas e Mulheres na Transição Energética”, aprovado pelo CNPq, com um orçamento de R$ 933.480,00. Este projeto busca capacitar mulheres e meninas, principalmente em áreas de menor acesso a oportunidades, para que atuem de forma ativa no setor energético. Além disso, promove ações de mentorias, participação em eventos técnicos, como a Olimpíada Nacional de Eficiência Energética (ONEE) da ANEEL, e oficinas educativas que conectam equidade de gênero e transição energética.

Nesse contexto, o setor de energia solar, e o elétrico como um todo, não pode ignorar que a diversidade é um fator crítico de sucesso. Mais do que uma obrigação ética, é uma decisão estratégica que alavanca a eficiência, aumenta a lucratividade e possibilita o desenvolvimento de soluções mais sustentáveis. A transição energética que o Brasil busca implementar não será plena sem integrar mulheres de forma efetiva, aproveitando sua capacidade de inovar e transformar o setor.

Portanto, avançar nessa direção significa não apenas fomentar um ambiente de trabalho mais inclusivo e respeitoso, mas também pavimentar o caminho para uma transição energética que, de fato, reflita os valores de justiça social e sustentabilidade que o setor preconiza.

 ₁ EPE. Empresa de Pesquisa Energética. Balanço Energético Nacional 2024: ano base 2023. Rio de Janeiro: EPE, 2024.
EPE. Empresa de Pesquisa Energética. Plano Decenal de Expansão de Energia 2030 (PDE 2030). Rio de Janeiro: EPE, 2021.
GREENER. Estudo Estratégico: Geração Distribuída – 1º Semestre de 2024. Agosto de 2024.
Woetzel, J. et al. How advancing women’s equality can add $12 trillion to global growth. McKinsey&Company , 2015.
C40 Cities Finance Facility. Energia Solar no Brasil: Quais são as Barreiras e Oportunidades para as Profissionais Mulheres no Setor?, 2021.


Sobre a autora:

Aline Cristiane Pan é Doutora em Energia Solar Fotovoltaica pela Universidade Politécnica de Madri, Professora do Curso de Engenharia de Gestão de Energia da UFRGS, Coordenadora Geral da Rede Brasileira de Mulheres na Energia Solar e integrante do Comitê Permanente de Ações Estratégicas e Políticas para Equidade de Gênero da CAPES/MEC. Contato: aline.pan@ufrgs.br

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