Conceitos básicos de eletrotécnica aplicada – 6ª parte Cargas das instalações e linearidade – cargas não lineares (harmônicas) e fator de potência

A presença de componentes de tensões e correntes com frequências diferentes da frequência fundamental em sistemas de corrente alternada originou a necessidade de estudo das causas e consequências desses componentes, normalmente, essas frequências são múltiplas da frequência fundamental. A abordagem do tema distorções harmônicas é bastante ampla dependendo do ambiente em que se está tratando. Apesar de a origem do tema estar vinculada à aplicação de cargas distorcidas nas instalações, a abordagem não é única. Uma das considerações pode estar especificamente vinculada aos equipamentos que serão alimentados por uma fonte ou instalação, ou sobre as consequências da operação destes equipamentos nestas instalações ou mesmo como será o comportamento de um sistema de potência que alimenta diversas subestações industriais, que, por sua vez, alimentam estas cargas distorcidas, ou seja, existe uma relação de causa e efeito que normalmente impacta a rede que alimenta cargas distorcidas, mas também pode impactar a operação de cargas que uma rede distorcida alimenta.

Os sistemas elétricos de potência podem possuir complexas redes elétricas, circuitos com comprimentos significativos, bancos de capacitores, reguladores e outros pormenores. Portanto, a delimitação e propósito de uma análise, ou mesmo definição e limitação da abordagem do estudo é um ponto de partida fundamental. É certo que a origem das distorções harmônicas nas instalações elétricas industriais, comerciais e residenciais é consequência do intenso uso de cargas não lineares.

Cargas não lineares são aquelas que, mesmo sendo alimentadas por uma fonte com tensão em frequência industrial com forma de onda senoidal não distorcida, apresenta forma de onda de corrente não senoidal. Esta característica ocorre geralmente pelo controle de operação da própria carga. As cargas não lineares mais comuns são os sistemas de iluminação a LED, os antigos mas ainda existentes sistemas de lâmpadas a gás (conjuntos de lâmpadas e reatores de vapor de sódio, de mercúrio e metálico), sistemas de iluminação com lâmpadas fluorescentes tubulares e compactas, além dos controles e acionamentos “dimerizáveis”; sistemas de acionamento de velocidade variável (tipicamente os inversores de frequência no acionamento de motores industriais) aplicados nos acionamentos de bombas, ventiladores, compressores, sistemas de transporte, retificadores e fornos industriais, incluindo os à arco, sistemas de soldas industriais, os sistemas de transmissão de sinais e de televisão, cargas de tecnologia de informação (cargas TI), como as que possuem fontes chaveadas como os servidores em data centers, computadores, processadores e seus periféricos, impressoras a laser. Nas residências e escritórios encontram-se ainda, além das lâmpadas de LED, os televisores, máquinas de lavar, geladeiras e outros eletrodomésticos com controle eletrônico, chuveiro elétrico com controle estático de temperatura e os sistemas de ar-condicionado. Ou seja, no mundo contemporâneo não existem mais (ou quase) as cargas lineares.

A justificativa para o uso dos controles nas cargas está relacionada, além do próprio controle de operação, ao aumento de produtividade dos processos e eficiência energética. Explicando melhor em um sistema de bombeamento: com a substituição de controle de vazão que aplica restrições mecânicas (válvula clássica) por outro com característica de variação da velocidade dos fluidos pelo acionamento de velocidade variável pode-se obter redução da energia consumida neste processo, que é proporcional ao quadrado da variação da velocidade. A possibilidade de integrar estes acionamentos a controles digitais como os controladores lógicos de processo (CLPs) é outra grande vantagem operacional.

As razões das cargas possuírem formas de onda de corrente não lineares, ou não senoidais, estão relacionadas ao comportamento de suas fontes próprias e acionamentos internos, normalmente relacionados à característica de operação dos semicondutores responsáveis por esta função.

São apresentadas na sequência as definições empregadas para a operação em regime não linear, o comportamento e integração entre fontes e cargas, aspectos de normalização e níveis de tolerância e soluções para a operação normal das instalações elétricas de forma que a presença destas cargas não lineares não interfira nos processos produtivos e no aumento das perdas elétricas.

Não se trata simplesmente de se eliminar as cargas não lineares, e esta tarefa é inglória, mas de entender os prós e contras do uso das mesmas e na sequência definindo soluções de convivência e compatibilização aos sistemas elétricos e fundamentalmente se definir se é necessário que alguma ação ou intervenção seja tomada.

 Forma de onda e espectro harmônico

Umas das cargas mais difundidas em instalações elétricas comerciais e industriais, incluindo equipamentos ligados diretamente em média tensão (classe 15 kV), são os motores acionados por inversores de frequência, ilustrado na Figura 1

Figura 1 – Motor acionado por inversores de frequência.

 

Devido ao controle de operação da carga, estes sistemas não lineares possuem componentes na corrente elétrica de entrada em frequências diferentes da frequência fundamental. A forma de onda de corrente é uma senoide distorcida, ou mesmo forma de onda não senoidal.

O modelo matemático de representação das componentes harmônicas ou simplesmente harmônicas de um sinal de corrente (ou tensão) destas cargas considera a aplicação do teorema de Fourier, onde um sinal não senoidal pode ser decomposto em vários outros sinais senoidais, definido matematicamente pela Série de Fourier.

Numa aplicação típica, tomou-se uma carga fictícia que apresenta a forma de onda de corrente ilustrada na Figura 2. Esta forma de onda, tratada como sinal “soma”, pode ser decomposta em outros três sinais senoidais, representados na tabela 1

Tabela 1 – Valores das correntes harmônicas

 

Figura 2 – Representação gráfica dos sinais senoidais e sinal “soma”.

 

Este tema continua na próxima edição.

 

 

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