*por Rodrigo Sauaia, Ronaldo Koloszuk e Guilherme Susteras
Nas últimas semanas, assistimos a uma participação crescente da sociedade nos debates sobre possíveis mudanças às regras da geração distribuída solar fotovoltaica. As manifestações chegaram, inclusive, ao Palácio do Planalto e ao Congresso Nacional, com posições favoráveis à fonte solar fotovoltaica por parte do Presidente da República, Jair Bolsonaro, e dos líderes parlamentares Rodrigo Maia (presidente da Câmara dos Deputados) e Davi Alcolumbre (presidente do Senado Federal).
Neste momento, os poderes Executivo e Legislativo trabalham, de maneira conjunta, para criar um marco legal para geração distribuída (GD) no País, em resposta à possibilidade de uma cobrança excessiva e desproporcional sobre a modalidade, conforme proposta apresentada pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) no segundo semestre de 2019.
Durante o processo de debate regulatório, uma das características principais tem sido a reação intensa da sociedade em defesa da GD solar fotovoltaica: parlamentares, lideranças públicas, entidades setoriais, federações, frentes parlamentares, profissionais que atuam no setor e no mercado, bem como consumidores que têm ou desejam ter GD solar fotovoltaica se uniram em defesa do desenvolvimento e crescimento desta tecnologia inovadora, que ainda dá os seus primeiros passos no Brasil. Exageros pontuais à parte, é compreensível a paixão que o tema suscita: mais do que uma nova tecnologia, tratam-se de valores cruciais, como liberdade, poder de escolha, sustentabilidade e legado para futuras gerações. Cabe, agora, sentarmos todos à mesa, para contribuir com a definição da melhor solução legal e regulatória para o bem do País e da sociedade.
A principal preocupação do mercado – e que levou a uma forte reação – foi a ruptura causada pela proposta feita pela Agência em outubro de 2019. Pudera: a nova recomendação da Agência – baseada em um cenário severo de alternativa 5 – efetivamente inviabilizaria o desenvolvimento de muitos novos projetos de GD solar, conforme reportou mais de uma consultoria de mercado especializada no assunto. Na prática, a cobrança de até 60% sobre a energia elétrica injetada na rede seria inaceitável para o mercado, pois faria com que diferentes modelos de negócio, importantes para democratizar a tecnologia aos consumidores brasileiros, deixassem de ser competitivos.
Diante dos desdobramentos em torno do tema, a Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar) tem apresentado sua visão sobre o assunto nos diferentes fóruns disponíveis. Isso inclui, além da habitual participação em Consultas Públicas da Aneel, uma forte atuação junto ao Congresso Nacional – onde trabalham os legítimos representantes da sociedade brasileira –, para estruturar uma política consistente e de longo prazo, que traga a necessária segurança jurídica, estabilidade e previsibilidade para o ecossistema da geração distribuída solar fotovoltaica, contemplando todos os elos e segmentos do mercado.
Desde o início da sua atuação, a Absolar trabalha em defesa do desenvolvimento sustentável deste segmento do mercado. Para tanto, uma de nossas principais diretrizes está na proposição de mecanismos regulatórios justos, considerando, de forma holística e equilibrada, tanto os benefícios quanto os eventuais custos da nascente GD solar fotovoltaica.
Nesse sentido, o debate construtivo com o regulador é um pilar fundamental da nossa atuação.
As contribuições da Absolar para o aprimoramento da Resolução Normativa nº 482/2012 são baseadas na qualidade técnica e especializada sobre a fonte e o mercado, com profissionalismo e bom senso, calculando, com transparência, os ganhos trazidos pela GD solar fotovoltaica ao País. Foram incorporadas as tendências globais de expansão da GD solar fotovoltaica por meio de soluções e projetos que combinem a descarbonização da matriz elétrica brasileira (já fortemente renovável, mas ainda com visível espaço de redução de emissões), a digitalização do consumo e a descentralização da geração de energia elétrica.
Sobre a revisão das regras para a micro e minigeração distribuída, é preciso considerar na análise três políticas públicas sólidas do arcabouço legal do setor elétrico brasileiro, sobre as quais o conceito da geração de energia elétrica junto à carga se estabeleceu: a eficiência energética, conforme a Lei nº 10.295/2001; a autoprodução, conforme o Decreto Presidencial nº 2.003/1996; e geração de energia renovável, conforme a Lei nº 9.074/1995. É essencial que a Aneel se debruce sobre os requisitos e as implicações do correto enquadramento da GD pela ótica do ordenamento legal vigente.
Isso permitirá desenhar uma revisão do sistema de compensação de energia elétrica que atenda aos requisitos definidos pelas políticas públicas brasileiras, devidamente estabelecidas pelo Congresso Nacional e pelo Poder Concedente.
Nosso trabalho neste início de 2020 seguirá na linha de contribuir em favor da construção de um marco legal e, posteriormente, regulatório que reconheça adequadamente os benefícios da GD, promova uma alocação justa sobre o efetivo e eventual uso de infraestrutura de redes de distribuição e, acima de tudo, atenda ao ordenamento jurídico já existente e a seus aprimoramentos, em relação às políticas públicas nas quais a GD se enquadra.
Rodrigo Sauaia é presidente executivo da Absolar.
Ronaldo Koloszuk é presidente do Conselho de Administração da Absolar.
Guilherme Susteras é coordenador do Grupo de Trabalho de Geração Distribuída da Absolar.