Iniciando esta série de artigos sobre o tema iluminação, decidi falar um pouco sobre as transformações da iluminação pública e a maneira como, atualmente, desenvolvemos os projetos no Brasil, fazendo um paralelo com os resultados que percebemos em outros locais.
Como tive oportunidade de vivenciar recentemente, como usuário, da iluminação de algumas cidades na Europa, percebo o quanto ainda existe diferença na concepção de um projeto luminotécnico. Mesmo com a atualização da NBR 5101 – Iluminação pública – procedimento em 2012 e sua fase de revisão iniciada em 2018, na prática temos visto a aplicação sem critério de projeto de luminária de LED na maior parte
das cidades do Brasil. O processo se inicia com um simples “de”/”para” que, em raras vezes, vem acompanhado de um estudo luminotécnico para embasar uma substituição ou um novo projeto.
O que acontece é que temos ruas e avenidas com luz, mas muitas delas sem qualidade na necessidade visual das pessoas. Esta necessidade está ligada intrinsecamente à luz refletida no campo de visão do usuário. Iluminar as cidades é pensar em luminância e não somente em luminância horizontal, como Já temos definido em Norma. A luminância vertical que, em muitas vezes indiretamente acaba ontribuindo para a luminância horizontal, é fundamental para a percepção do ambiente urbano, do espaço onde circulamos e da tridimensionalidade do meio em que vivemos. Iluminar as fachadas, com o devido respeito que devemos ter para evitar a luz intrusa e a poluição luminosa, é propiciar a quem circula a pé por uma cidade uma melhor experiência visual, interagindo com o local e vivenciando a cidade por mais tempo.
Não somente fachadas, mas outras superfícies verticais como muros, paredes, paredões, jardins verticais, guarda corpos em passarelas, passagens e escadarias, são importantes de serem iluminados para compor o ambiente com a iluminação pública convencional que vai para o piso, gerando inclusive mais conforto visual devido à uniformidade visual e luz mais difusa com baixo ofuscamento. Para ficar mais claro, ninguém deveria pensar em iluminar sua residência somente iluminando o piso, com lâmpadas soltas em
pontos no teto da casa, “jogando” luz para o ambiente e ofuscando o usuário. Um projeto residencial de qualidade leva em conta diversos outros aspectos de qualidade da luz para as pessoas, valorizando o ambiente e tornando as pessoas mais felizes em diferentes cenários do ambiente residencial e em diferentes espaços de acordo com o uso de cada um.
Infelizmente, muitas vezes o que está sendo feito em nossas cidades é jogar luz no chão com o objetivo de “iluminar” tudo em prol de uma falsa sensação de segurança criada pelo excesso de luz. Fato este ainda é agravado pela disponibilidade de colocação dos pontos de iluminação nos postes da distribuidora de energia, com grande espaçamento, baixa altura de instalação, gerando alto ofuscamento e descontinuidade (baixa uniformidade). Já evoluímos com a necessidade de iluminar as calçadas e não somente das vias para os veículos, bem como levando em conta outros critérios de qualidade de projeto, mas ainda temos muito a evoluir com a necessidade de projetos que levem em conta não somente o
atingimento de índices normativos, mas que tragam novos conceitos e sejam adequados à qualidade de luz que esperamos propiciar para as pessoas, sejam elas residentes ou visitantes das cidades.
Precisamos pensar em certos ambientes, na criação de cenários noturnos, de acordo com a sua ocupação, seja pela quantidade de pessoas a cada horário, eventos, estações do ano ou outra necessidade específica. A qualidade da iluminação vai muito além do uso da tecnologia LED, da eficiência energética e da qualidade dos equipamentos utilizados que são de grande importância. A iluminação
pública deve ser pensada do ponto de vista da qualidade da iluminação e da necessidade das pessoas, de acordo com a criatividade do projetista, a luz como forma de interação social, convivência e sempre tendo em conta as imagens que levaremos dos locais que circularemos e visitaremos à noite.