Inteligência Artificial: Uma breve análise estratégica do posicionamento do Brasil no contexto mundial

Por: André Sih

Não é novidade para ninguém que a Inteligência Artificial (IA) é algo que está revolucionando (ou assustando o mundo)?! Porém, como o Brasil está posicionado em relação ao mundo nesta revolução? Para podermos entender esta questão, primeiramente devemos analisar quais são os principais indicadores que trazem, em algum grau, uma relação de causa e efeito sobre o sucesso do desenvolvimento e a aplicação de novas soluções de IA, a saber: (1) indicadores de avanço em termos científicos, como a quantidade de artigos científicos publicados (preferencialmente em revistas Qualis A e B); (2) resultados tecnológicos, como a quantidade de patentes registradas; e (3) o envolvimento empresarial e investimento das empresas atuantes no setor como o quantitativo de investimentos (privados ou públicos) seja em P&D, ofertas públicas, fusões e aquisições, compra de participações minoritárias, investimentos de empresas de Private Equity e Venture Capital em startups no setor de IA, dentre outros, são importantes indicadores de como cada nação se posiciona na corrida pela liderança da IA.

Se observarmos o conjunto destes indicadores, de forma geral veremos que os EUA mantêm a dianteira (com alguma folga), seguidos de China, UE e Japão. Porém, a taxa de variação positiva de crescimento destes indicadores (aceleração) é tão ou mais relevante para predizermos com relativa confiabilidade qual nação “dominará” esta tecnologia, e conquistará mais rapidamente os benefícios da IA e se tornará hegemônica mundialmente. Neste caso, a China é quem se apresenta com uma maior taxa de crescimento comparativamente aos demais países.

Observa-se que, embora pelos dados da base Microsoft Academic Graph (MAG), a China tenha ultrapassado os Estados Unidos em números absolutos de publicações em revistas em 2019, no acumulado entre 2016 e 2020, os Estados Unidos continuam à frente da China. Considerando apenas as top 25% melhores publicações científicas, a China é ultrapassada também pela União Europeia. A relação entre o número de publicações nas top 25%, e o total, é de 43,6% nos Estados Unidos, 23,5%, na União Europeia e 19,8%, na China. Essas informações, indicam que, apesar do avanço, as publicações chinesas, nas revistas mais conceituadas, ainda se encontram atrás de Estados Unidos e União Europeia.

Há de se entender melhor as várias particularidades no ecossistema de IA da China. A proibição de aplicativos ocidentais no mercado chinês é uma delas. Mas há um trade-off de outras tantas aplicações que são desenvolvidos localmente que nascem com um potencial de atender à segunda maior população do planeta. E por que isso é importante? Sabemos que a IA precisa de dados para ser treinada e aprender. Logo, esses dados, em larga escala, são fonte importante para o desenvolvimento e treinamento de novos modelos de IA.

Outra particularidade chinesa é a ação governamental. Como país de partido único, as diretrizes do governo central são naturalmente adotadas pelos governos subnacionais, que implementam suas próprias políticas, mas sempre alinhadas com a orientação superior. Outro aspecto importante a se destacar é a disponibilidade de um grande contingente de profissionais qualificados para o desenvolvimento dos modelos de IA, especialmente das áreas STEM (Science, Technology, Engineering e Mathematics), segmentos em que o Brasil carece de mão de obra qualificada em abundância, diga-se de passagem.

Além disso, a China é conhecida pelos seus planos estratégicos quinquenais, em que, a cada 5 anos, são definidos os objetivos a serem atingidos nos próximos 5 anos seguintes. Neste contexto, foi desenvolvido um Plano Nacional de Inteligência Artificial de Nova Geração (PNIA), lançado oficialmente em 2017, mas que já havia recebido atenção em anos anteriores. Neste plano, foram destacadas ações em áreas como financiamento, padronização de sistema, proteção à propriedade intelectual, cooperação internacional e desenvolvimento de capital humano. Em seus objetivos, o PNIA estabelece a meta de atingir, em 2025, avanços importantes em pesquisa básica, tecnologias e aplicações de IA, elencando-os, como vetores para o desenvolvimento da China. Para 2030, a meta é atingir níveis compatíveis com a disputa pela liderança global, em termos de inovação, obtendo resultados relevantes na construção de uma economia e sociedade “inteligentes”.

No Brasil, as primeiras estratégias públicas de IA começaram a ser implementadas em 2021, enquanto que nos EUA, tais iniciativas começaram em 2019. Já na China, essas diretrizes tiveram início em 2017, ou seja, não estamos tão mal assim.

No caso da América Latina (Latam), considerando seus seis principais países, a proporção entre as publicações no top 25% e as publicações totais da Latam foram de cerca de 11%. Destes, a participação brasileira, no total mundial, permaneceu relativamente estável, em torno de 3%, com um crescimento importante da produção científica brasileira em IA, porém seguindo o ritmo do aumento da produção mundial, o que não nos faz nos aproximar dos líderes.

E sobre as patentes de IA registradas? Segundo o Artificial Intelligence Index Report (AIIR) de 2024, que concatenou os dados até 2022, neste ano, a China liderou as origens globais de patentes de IA, com 61,1%, ultrapassando significativamente os Estados Unidos, que foram responsáveis ​​por 20,9% das origens de patentes. Desde 2010, a participação dos EUA diminuiu de 54,1%. Neste mesmo estudo, a América Latina corresponde a apenas 0,21% das patentes de IA.

Finalmente, um último conjunto de indicadores pode ser analisado a partir das informações associadas aos investimentos realizados em empresas ligadas ao setor de IA. Se olharmos o setor privado e seu ecossistema de inovação, os EUA parecem imbatíveis. Em 2023, segundo o AIIR, os Estados Unidos viram os investimentos privados em IA atingirem 67,2 bilhões de dólares, quase 8,7 vezes mais do que a China, o segundo maior investidor. E os investimentos privados em IA na China e na União Europeia, incluindo o Reino Unido, diminuíram 44,2% e 14,1%, respectivamente. Porém, há de se observar, que nem todas as informações da China são traduzidas no número chinês, porque grande parte destes investimentos são realizados direta ou indiretamente pelo governo. Mas, de fato, os Estados Unidos registraram um aumento notável de 22,1% no mesmo período, desde 2022.

Consistente com as tendências do investimento privado, os Estados Unidos lideram todas as regiões, com 897 empresas que de IA que receberam investimentos, seguidos pela China, com 122, e pelo Reino Unido, com 104. E o Brasil? Em 2023, apenas 15 empresas!

De forma geral, no caso específico da América Latina, existem ainda poucos estudos que buscam analisar, de maneira abrangente, as estratégias (e seus resultados) de atores públicos e privados, as políticas de apoio, o grau de difusão das tecnologias e os modelos de negócios associados à IA.

Porém, é claramente percebido, pelos números aqui apresentados, que o Brasil está entre os últimos nessa “corrida pelo ouro da IA”.

Curiosamente, a IA poderá levar a um crescimento global da produtividade ao longo de períodos de 10 anos, variando entre 1,0% e 1,5%, de acordo com um relatório de investimento da Goldman Sachs, divulgado em 2023. Muitos países irão beneficiar-se do crescimento da produtividade impulsionada pela IA. Países como Hong Kong, Israel e Japão, estão especialmente bem posicionados. Neste caso, o Brasil não está tão mal, com 1,4%, em 11º lugar. Ou seja, o Brasil é um dos países que mais podem se beneficiar da IA, como importante vantagem competitiva para acelerar a sua produtividade e o seu desenvolvimento.

É fato que existem grandes especialistas brasileiros na academia (muitos mestres com quem aprendi IA) e no mercado, seja cientistas de dados, líderes ou empreendedores. Temos exemplos de startups de sucesso, como a Agrosmart, que aplica IA no agronegócio (conhecida vocação brasileira) e até mesmo a mais nova unicórnio brasileira, a Semantix, que aplica IA em suas soluções. O futuro dirá se estas são honrosas exceções ou o início de um padrão resultante (promissor ou desalentador) a se formar. Como o Brasil pode aproveitar melhor as oportunidades geradas pela IA? Isso é assunto para um próximo artigo. 

Mas tem algo que podemos fazer agora, como testar a IA generativa e analisar se ela ajuda nesta resposta: se este autor desafiasse o ChatGPT (versão gratuita), fazendo as perguntas do início deste artigo: “não é novidade para ninguém que a Inteligência Artificial (IA) é algo que está revolucionando (ou assustando o mundo)?! Porém, como o Brasil está posicionado em relação ao mundo nesta revolução?” teríamos a seguinte resposta:

“O Brasil está de fato avançando no campo da Inteligência Artificial. Embora possa não estar na vanguarda como alguns outros países, o Brasil tem investido em pesquisa e desenvolvimento de IA. Diversas universidades e instituições de pesquisa no Brasil estão trabalhando em projetos de IA, e há um número crescente de startups com foco em soluções de IA. O governo brasileiro também demonstrou interesse em apoiar iniciativas de IA para melhorar vários setores, como saúde, agricultura e finanças. Apesar de enfrentar desafios como financiamento e retenção de talentos, o Brasil está gradualmente conquistando seu espaço na revolução global da IA.”

Você pode até não concordar em como a pergunta foi formulada para a máquina, porém a ideia foi essa mesmo: simular uma conversa informal entre duas pessoas. Então, qual é a melhor resposta, ilustre leitor? A IA, neste caso, superou o humano?

*Andre Sih é Sócio-Diretor da Fu2re, Startup brasileira de Inteligência Artificial

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