Edição 79 – Setembro de 2012
Por Michel Epelbaum
Aproveitando o acontecimento do maior evento esportivo planetário, descrevo nesta coluna o lado da sustentabilidade que não é mostrada na cobertura dos Jogos Olímpicos.
A cidade de Londres propôs em 2007 o “Plano de sustentabilidade Londres 2012: rumo a um planeta”, com o objetivo de sediar os Jogos Olímpicos mais sustentáveis possíveis. O processo foi dividido em três etapas:
1) 2007 – 2011: nesta fase, a sustentabilidade foi incorporada ao projeto e à construção do Parque Olímpico, de outros locais permanentes e infraestrutura;
2) 2011 – 2012: esta fase está centrada na realização dos Jogos Olímpico e Paraolímpico;
3) 2013 em diante: os jogos devem garantir um bom legado ambiental e social para a área do Parque e Vila Olímpicos e por todo o Reino Unido.
O Plano está centrado em cinco temas-chave, sendo três deles ambientais e dois sociais/ econômicos, sobre os quais apresentamos as principais metas e os resultados alcançados:
- 1. MUDANÇAS CLIMÁTICAS
Reduzir as emissões de gases de efeito estufa e garantir instalações capazes de lidar com os impactos das mudanças climáticas.
Principais metas:
– Atingir em 2013 uma redução de 50% nas emissões de carbono dos edifícios permanentes no Parque Olímpico, tendo como referência o Regulamento de Edificações de 2006.
– Fornecer 20% da energia usada, no parque após os jogos, de fontes renováveis internas ao local.
– Prover frete de 50% em peso dos materiais de construção do parque por ferrovia ou hidrovia.
– Usar frota de veículos/ônibus de baixa emissão durante os jogos.
– Prover combustível de baixo (ou zero) carbono para as piras Olímpica e Paraolímpica.
– Fazer com que 100% dos espectadores dos Jogos Olímpicos utilizem o transporte público, a bicicleta ou a caminhada como meio de transporte para ir e voltar das atividades (por meio de ciclovias e plano de transporte).
Principais resultados:
– Redução de 58% nas emissões de carbono derivadas das operações de construção do Parque Olímpico até dez/11.
– 10% da energia utilizada nas instalações eram provenientes de fontes locais e renováveis até dez/11. Previam-se inicialmente turbinas eólicas dentro do Parque Olímpico, para obter a meta, porém elas não foram implementadas.
– Realização do primeiro estudo abrangente de pegada de carbono de Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de Verão.
– A mistura de concreto usada na construção da Vila e Parque Olímpico atingiu mais de 40% de redução de carbono comparada com especificações padrão.
– Todos os prédios permanentes estão sendo rastreados para ser 15% mais eficientes do que os prédios equivalentes do Código de 2006.
– Frete de 67% em peso dos materiais de construção do Parque por ferrovia ou hidrovia.
– 4.000 carros doados pela BMW para o uso durante os jogos atendem aos padrões legais de emissão do Euro 6, com baixa emissão de poluentes.
- 2. RESÍDUOS
Reduzir os resíduos em todas as etapas do projeto e encorajar o desenvolvimento de novas infraestruturas para seu tratamento, além do aterro.
Principais metas:
– Recuperar 90%, em peso, do resíduo de demolição para reuso ou reciclagem.
– Usar 20%, em valor, do material de construção de fontes de reuso ou reciclagem.
– Evitar que 90% do resíduo de construção seja destinado em aterro.
– Assegurar que nenhum resíduo gerado durante os jogos sejam enviados diretamente para aterros.
– Tratar todo o resíduo como uma matéria prima potencial para assegurar que no mínimo 70% do resíduo gerado durante os jogos sejam reusados, reciclados ou passem por compostagem.
Principais resultados:
– 98,5% do resíduo de demolição e 99% do resíduo de construção do Parque foram reciclados (ou reusados em alguns casos) até dez/11.
– Um total de oito prédios foram reusados externamente.
– Uso de 34%, em valor, do material de construção de conteúdo reciclado.
– Mais de 80% do solo foi descontaminado e reusado no Parque Olímpico.
– Fundações do Centro Aquático, Arena de Handebol e do Estádio Olímpico usaram concreto com mais de 30% de materiais reciclados.
- 3. BIODIVERSIDADE
Reduzir o impacto dos jogos na vida selvagem e nos seus habitats do entorno.
Principais metas:
– Incluir uma seção de Biodiversidade nos requisitos de sustentabilidade em projetos para prédios temporários e coberturas.
– Criação de 45 hectares de habitat e área com cobertura vegetal.
Principais resultados:
– Criação de 25 hectares para os Jogos e 45 hectares de habitat e área com cobertura vegetal no Parque Olímpico após os jogos (um dos maiores parques urbanos criados na Europa nos últimos 150 anos).
– Recuperação de áreas verdes degradadas na cidade.
– Projeto da Vila Olímpica, Centro Aquático, Eton Manor e Centro de Imprensa incluem mais de 15 mil m² de telhados vivos.
- 4. INCLUSÃO
Promover o acesso a todos e celebrar a diversidade de Londres e do Reino Unido, criando novas oportunidades de emprego, formação e negócios, incluindo critérios de ética e requisitos socioambientais nas compras.
Principais metas:
– Grupo de Trabalho de Emprego de Londres para reduzir desemprego na cidade de 70 mil em 2012.
– Prover 20 mil locais de treinamento no Parque Olímpico nos próximos cinco anos.
– Programa Internacional de Educação e Inspiração para atingir 12 milhões de crianças em 20 países.
– Atingir metas ambiciosas de recrutamento de pessoal de grupos mais sensíveis, como mulheres e portadores de necessidades especiais.
– Prover um serviço de mobilidade aos espectadores em todos os locais de Jogos.
Principais resultados:
– Após os Jogos, moradores locais podem passar o dia no Parque Olímpico e desfrutar de um piquenique e conhecer áreas naturais reflorestadas do
local, como as matas ciliares e florestas úmidas.
– 22 mil escolas e colégios estão participando de iniciativas envolvendo o evento.
– 12 milhões de crianças e jovens por todo o mundo foram estimulados a serem mais ativos devido ao programa de inspiração internacional.
– Recuperação de áreas degradadas na zona leste da cidade.
– Site CompeteFor para compras eletrônicas para as Olimpíadas 2012, com 10.200 oportunidades de negócios, 41.600 fornecedores registrados de Londres e mais de 153.000 no país.
– Programas de treinamentos e empregos com investimento de 14 milhões de libras para mais de 10.000 desempregados e 2.500 residentes locais.
- 5. SAÚDE/QUALIDADE DE VIDA
Inspirar o estilo de vida ativo, saudável e sustentável nas pessoas por intermédio do evento.
Principais metas:
– Zero acidente de trabalho durante a fase de construção.
– Definição e implementação da Visão Alimentar 2012, focada em cinco áreas: segurança e higiene alimentar; escolha e balanceamento de alimentos, critérios para a cadeia de suprimentos (por exemplo: comércio justo); gestão ambiental; e educação.
– Inspirar ao menos 2 milhões de pessoas na Inglaterra a tomar parte em atividades esportivas e a ter uma vida mais saudável e ativa até 2012.
– Oferecer 5h de esporte por semana para as pessoas na faixa de 5-16 anos e 3h de esporte por semana para a faixa de 16-19 anos até 2012.
Principais resultados:
– Taxas de acidentes durante a construção abaixo da média da indústria da construção.
– 90% das crianças estão fazendo 2h de atividades esportivas por semana.
– 15,5 milhões de libras investidos para o desenvolvimento do esporte na comunidade nos próximos três anos.
Além disso, destacam-se os seguintes resultados:
– Água sustentável – redução do uso de água nos novos prédios: 60% em dez/11 (meta: 40%).
– Materiais sustentáveis – 86% dos materiais provenientes de processos com responsabilidade socioambiental (meta: 80%); 100% da madeira proveniente de fontes renováveis (meta: 100%).
– Onde possível, foram usados locais existentes para as competições, como Wimbledon (tênis); onde não havia necessidades pós-Olimpíadas, foram construídos locais temporários (exemplo: arena de basquetebol, hipismo), os quais serão desmontados (e alguns levados para a Olimpíada Rio 2016).
Vejo avanços interessantes na:
– Busca do transporte sustentável.
– Priorização do legado após os jogos (externo minha preocupação pelo legado da Copa do Mundo no Brasil: dispêndio enorme em alguns estádios que terão baixo uso após a Copa).
– Busca da eficiência energética e redução de emissões nos novos locais construídos.
– Visão alimentar de suporte.
– Integração entre o evento em si e a “economia verde inclusiva” (palavra em voga após a Rio+20), ainda mais num momento de crise econômica.
Vimos que nem todas as metas foram atingidas, mas a avaliação dos erros e acertos destes Jogos Olímpicos será muito importante para poder subsidiar o plano de sustentabilidade da Copa do Mundo e do Rio 2016. E servirá ainda para visualizar o potencial mercado para algumas soluções, tecnologias, produtos, materiais e serviços do setor elétrico nos próximos anos.
Vamos fazer dos próximos grandes eventos no Brasil uma referência em sustentabilidade econômica, ambiental e social?