Nova revolução tecnológica

Edição 123 – Abril de 2016
Reportagem: Revolução tecnológica
Por Bruno Moreira

 

A sociedade começa a sentir os efeitos do surgimento de sua quarta revolução industrial, encabeçada pela Internet das Coisas, que já começa a ser utilizada na automação de processos industriais, na iluminação e em eletrodomésticos.

 

Aquelas histórias de ficção científica, em que máquinas computadorizadas possuem a capacidade de se desenvolverem (como seres humanos) e tomarem a frente em tarefas das mais diversas, agindo de forma autônoma, sem a necessidade de comando ou de qualquer tipo de ordem das pessoas, parecem estar cada vez mais próximas de se tornarem realidade. E um importante passo para que isso ocorra ganha cada vez mais espaço no país e no mundo entre os mais diferentes setores da sociedade, com o objetivo de facilitar a vida do ser humano. É a Internet das Coisas, que surgiu do inglês Internet of Things (IoT), conceito que basicamente significa a conexão de todos os objetos usados no nosso cotidiano à rede mundial de computadores.

Para entender a IoT, na maneira como ela é aplicada atualmente, é preciso em primeiro lugar demonstrar o seu funcionamento. O executivo de soluções cognitivas da IBM, Carlos Tunes, explica que a IoT está separada “em três grandes camadas empilhadas”. A primeira delas, que fica na base, é formada pelos dispositivos em geral, eletrodomésticos, lâmpadas, máquinas, um relógio, um tênis, um carro, etc. Estes dispositivos possuem sensores embarcados. A segunda camada, intermediária, é responsável pela captação desses dados e pela transformação desses dados em informações relevantes aos negócios em que estes dispositivos estão relacionados. Por fim, há uma terceira camada, mais acima, na qual soluções de negócios usufruem dessas informações de maneira a melhorar o serviço prestado ao usuário e a desenvolver o negócio realizado.

Um exemplo de como estas camadas funcionam na prática são rastreadores instalados em um veículo automotivo por montadoras. Eles, funcionando como sensores, captam variadas informações do carro e, consequentemente, do comprador/usuário do veículo, tais como lugares frequentados e média de velocidade empregada. Esses dados podem ser utilizados pela própria montadora, para o desenvolvimento e comercialização de um produto futuro, mas também por uma companhia de seguros, que pode tirar desses dados, captados pelos sensores, padrões de comportamento do usuário para o oferecimento de uma apólice com mais conformidade ao cliente.

Tunes comenta que, na atualidade, a IoT é muito difundida na Europa e nos Estados Unidos. Neste país, por exemplo, vem ganhando destaque a interação entre os eletrodomésticos, por meio da rede. Conforme o executivo da IBM, a Whirlpool, fabricante de eletrodomésticos, que detém as marcas Brastemp e Consul, lançou recentemente nos Estados Unidos uma linha de eletrodomésticos (geladeira, máquina de lavar roupa, fogão) inteligentes. Além de estes equipamentos poderem ser programados para funcionarem de forma interativa entre si, podem-se estabelecer parâmetros que associam a máquina de lavar, por exemplo, ao usuário, que, por meio de um sensor acoplado ao seu smartphone consegue programar a máquina de lavar para ser acionada toda vez que chegar em casa.

Estes sensores permitem também o diagnóstico remoto de problemas nestes equipamentos pelas assistências técnicas e também um controle do próprio fabricante que pode se antecipar ao usuário e entrar em contato com ele caso seja detectado um potencial mau funcionamento do eletrodoméstico. Para a assistência técnica, a presença desta tecnologia propicia a melhoria do nível de serviço e do nível de relacionamento com o cliente. Para o fabricante, a tecnologia possibilita a obtenção de padrões de comportamento que servem para estabelecer novos padrões visando desenvolver outros produtos.

No Brasil, a IoT vem sendo empregada em larga escala na área industrial. A ABB, por exemplo, emprega este conceito e as tecnologias a ele aplicadas em seu segmento elétrico e na automação de processos para auxílio na tomada de decisão de seus funcionários. Conforme o gerente de aplicação e produto da área de Indústrias de Processo da ABB, Marcos Hillal, a principal plataforma de partida para a Internet das Coisas da companhia está na indústria de processo e chama-se 800 xA.  Trata-se de um sistema de automação que conecta diversos equipamentos existentes na planta cujo objetivo principal é fazer o controle de produção, mas também possibilita a definição da política de manutenção dos equipamentos utilizados no processo de produção, a operação mobile de processos via wireless e o gerenciamento de ativos. “Consigo saber se uma correia que está sendo transportada está próxima de uma falha, por exemplo”, declara o gerente.

Hillal faz questão de salientar, no entanto, que para o conceito de Internet das Coisas (IoT), tal como a ABB o compreende, fazer sentido é preciso levar em conta mais dois pilares: as pessoas e o serviços a ele atrelados. O que transformaria o conceito em “Internet da Coisas, Serviços e Pessoas (IoTSP)”. Nesse sentido, “as pessoas vão sempre estar à frente em uma tomada de decisão”, explica o gerente. Já os serviços são o uso daquelas informações de maneira inteligente através de um especialista que saberá aplicar aquele leque de dados gerados com praticidade. Assim, o grande desafio, segundo Hillal, passa a ser transformar o pacote enorme de informações que se tem desses equipamentos em algo útil para a empresa e, consequentemente, para o consumidor. O gerente reitera a importância da IoTSP, que define como ponto crucial e base de um conceito mais amplo definido como 4ª Revolução Industrial.

Medição inteligente e regulamentação

Segundo o gerente geral de Serviços e Soluções para Smart Grid da Siemens no Brasil, Sergio Jacobsen, quando se pensa em Internet das Coisas atrelada ao setor elétrico, não se pode deixar de pensar, do mesmo modo, em redes inteligentes e em eficiência energética. Ou seja, para ele, o elemento básico da IoT e do funcionamento desta rede automatizada é o med

idor inteligente (smart meter), cuja regulamentação já foi implementada no Brasil, mas cuja difusão maciça ainda não se tornou realidade.

Funcionando em conjunto como uma rede de comunicação implantada pela própria concessionária, o medidor inteligente agrega funcionalidades e possibilita à concessionária de energia elétrica e ao consumidor realizar tarefas antes não imaginadas, gerando benefícios a ambos. “Para o consumidor, por exemplo, acarreta transparência no consumo, para que ele possa consumir de forma mais eficiente”, afirma Jacobsen. Por meio do medidor, o usuário pode verificar seu consumo a cada 15 minutos e avaliar detalhadamente se seus modos de consumo estão gerando economia. Se a troca de lâmpadas por equipamentos mais eficientes energeticamente está surtindo efeito. Além disso, auxilia também no caso da geração distribuída, permitindo ao consumidor verificar se a energia gerada excede a energia consumida, e a quantidade de crédito que será gerada neste processo.

Já do ponto de vista da concessionária, o primeiro benefício direto a ser considerado é a redução do custo operacional. Com a medição automatizada e remota, a distribuidora pode evitar os investimentos relacionados ao leiturista, por exemplo, e também com os serviços de manutenção, já que o religamento e o desligamento da energia podem ser feitos remotamente. Outra vantagem para a concessionária que pode advir da medição inteligente é a redução de perdas comerciais, os furtos de energia. “Quando a empresa está apta a medir o consumo de 15 em 15 minutos, ela consegue pegar mais facilmente estas perdas”, explica o gerente. Além disso, as tecnologias de automação e informação empregadas para o funcionamento do smart grid possibilitam à concessionária um maior conhecimento do consumo de cada ponto de sua rede de distribuição, proporcionando, em decorrência, um melhor uso dessa rede e um planejamento mais preciso de sua ampliação e manutenção.

De acordo com o gerente da Siemens, o que falta ainda para que o smart grid e, consequentemente, a IoT ligada ao segmento elétrico deslanche no Brasil é uma regulamentação mais abrangente por parte das autoridades governamentais. Jacobsen cita, por exemplo, um produto que a Siemens desenvolveu nesta área: o Energy IP, uma plataforma computacional voltada a aplicações para redes inteligentes. Trata-se de uma solução que integra um software e um medidor inteligente e que já vem sendo adquirida por algumas concessionárias, como a AES Eletropaulo, para 65 mil pontos, e seis empresas da Eletrobrás, para 100 mil pontos. Contudo, segundo o executivo da Siemens, não será permitido utilizar todas as funcionalidades do produto, pois não há a regulamentação específica.

Não que não tenha havido um grande progresso nesta seara, como, por exemplo, a instauração, por parte da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), da Tarifa Branca, que possibilita ao consumidor pagar valores diferentes em função da hora e do dia da semana; da regulamentação dos medidores eletrônicos de consumo de energia, em 2012, e do aprimoramento da Resolução Normativa nº 482/2012, em 2015, que criou o Sistema de Compensação de Energia Elétrica. Contudo, segundo Jacobsen, estas leis ainda não são suficientes para permitir a utilização mais completa de todas as funcionalidades dos medidores inteligentes. A tarifa branca, por exemplo, é opcional, o que desestimulou a venda destes equipamentos. E não há, segundo o gerente da Siemens, uma lei específica para regulamentar soluções de resposta à demanda, que possibilitam ao consumidor e ao distribuidor, a modulação da demanda de energia elétrica.

Gestão de ativos

A utilização da IoT é importante também para as empresas do setor elétrico melhor gerenciarem seus ativos. Por meio de sensores, softwares de automação e tecnologias de comunicação, as distribuidoras podem monitorar a saúde de subestações, relés e máquinas. Conforme o gerente de aplicação e produto da área de Indústria de Processo da ABB, Marcos Hillal, cada dispositivo dentro de uma subestação passa a ser um elemento ativo que disponibiliza informações para a concessionária. Hillal explica que a comunicação neste processo acaba ocorrendo de duas maneiras: horizontal, entre os equipamentos; e vertical, dos equipamentos para um sistema centralizado que irá correlacionar as informações e suportar a tomada de decisão da concessionária.

Resumidamente, a IoT permite que informações personalidades de variados equipamentos da concessionária sejam transmitidas para especialistas que, a partir, desses dados, conseguirão tomar decisões relacionadas aos ativos da empresa, como a detecção de falhas iminentes e de probabilidade de falhas, e a realização de manutenções programadas.

Uma pesquisa realizada pela ABB junto a mais de 200 executivos de concessionárias de energia, gás e água, deixa claro a relevância que vem adquirindo a IoT para a gestão de seus ativos. Conforme o levantamento, cerca de 80% consideram a integração entre Tecnologia da Informação (IT) e Tecnologia Operacional (OT) muito valiosa. Por sua vez, 58% dos entrevistados têm, ou planejam ter, uma estratégia de IoT para a gestão dos ativos, e 55% afirmam ter crescido a importância da gestão dos ativos nos últimos 12 meses.

Para o executivo de soluções de Utilities da América Latina, divisão de Enterprise Software, da ABB, Marcos Vilela, estes números refletem a procura cada vez maior das concessionárias por eficiência energética, redução de custos e melhoria dos serviços prestados. “Para isso acontecer, estas empresas precisam gerir bem os seus ativos, já que elas são fundamentalmente ativo-intensivas, ou seja, o desempenho delas é baseado na qualidade da gestão de seus ativos”, explica. O que ocorre, de acordo com Vilela, é que o conhecimento dos ativos está cada vez mais conectado à IoT. Principalmente, a gestão de ativos críticos, como os transformadores de uma subestação, cuja falha, pode prejudicar milhares de consumidores. Ativos mais conectados podem gerar mais dados que podem ser utilizados para melhorar a gestão dos ativos e também os serviços prestados pela concessionária.

A Internet da Luz

A IoT também vem sendo aplicada no segmento da iluminação elétrica. A fabricante de lâmpadas FLC destaca dois produtos que estão relacionadas a este conceito. Um deles é a lâmpada Smart Led, apresentada pela fabricante na Feicon Batimat 2016, ocorrida, em São Paulo, no mês de abril, e com previsão de início de vendas para maio deste ano. Segundo o diretor de marketing da FLC, Paulo Mündel, trata-se de uma tecnologia Led que se conecta a um smartphone ou a um tablet

via tecnologia bluetooth e pode ser controlada pelo usuário através de um aplicativo. “Por meio do app, você pode dimerizar e controlar a temperatura de cor da lâmpada”, relata Mündel. É possível também controlar não apenas um, mas um grupo de lâmpadas. O usuário consegue montar um grupo de lâmpadas e controlar este agrupamento via cenários estabelecidos no próprio aplicativo.

Luminária em Led, o equipamento também apresenta conexão via bluetooth com um celular ou tablet e pode ser dimerizado com um simples toque no topo do dispositivo, por conta de um sensor instalado no local.

Outro produto desenvolvido pela FLC atrelado ao conceito de IoT é a luminária portátil noturna, lançada em março durante a feira de iluminação Lighting + Building, que ocorreu em Frankfurt, na Alemanha, mas que só será apresentada ao Brasil em julho próximo. Luminária em Led, o equipamento também apresenta conexão via bluetooth com um celular ou tablet e pode ser dimerizado por um simples toque no topo do dispositivo, em razão de um sensor instalado no local. Por conta da conexão com o celular ou tablet, é possível ouvir música e receber ligações através da luminária. Além disso, o equipamento pode funcionar como relógio-despertador. O diretor da FLC também destaca a portabilidade da luminária, que pode ser carregada na mochila durante viagens.

Não obstante a inovação trazida pelo desenvolvimento da luminária portátil noturna e do Smart Led, Mündel salienta que estas tecnologias podem ser consideradas o início, “um primeiro passo”, da conectividade entre produtos de iluminação e aparelhos celulares e tablets, por exemplo. A Internet das Coisas voltada para a iluminação elétrica pode e deve ter alcances muito mais amplos, como o gerenciamento inteligente do parque de iluminação pública de uma cidade. O diretor de Inovação da integradora de serviços e soluções de Tecnologia da Informação, Sonda IT, Edson Sayeg, relata que a empresa chegou a desenvolver um projeto de iluminação pública neste sentido para cidade de São Paulo, que acabou não se concretizando. Conforme o diretor, cada poste de iluminação na Marginal Pinheiros funcionaria como um endereço de Protocolo de Internet que se comunicaria com os demais e com um concentrador. Este sistema central, por sua vez, munido dessas informações, poderia otimizar o consumo de energia das luminárias públicas, em função da movimentação de pessoas ou da hora do dia (necessitando mais ou menos luz), gerando economia para o município e para o consumidor.

Projeto semelhante foi desenvolvido pelo Centro de Pesquisa Smart Cities da empresa de origem chinesa Huawei, localizado no Parque Científico e Tecnológico da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), em Porto Alegre. Coordenador do Centro, o professor Fabiano Hessel, explica que se trata de um sistema de iluminação pública inteligente, que possibilita ao responsável pelo parque de iluminação operar uma luminária a distância, ligá-la, desligá-la, dimerizar o equipamento e mapear dados, controlando remotamente a luminosidade, a temperatura de cor e o consumo de energia do parque de iluminação. O projeto já está pronto, segundo Hessel, faltando apenas os testes de campo, que serão feitos na cidade de Porto Alegre. “A prefeitura está definindo em qual rua ou avenida será testado o sistema”, declara o coordenador.


A principal função do Centro de Pesquisa da Huawei é o desenvolvimento da CityOS, sistema operacional da cidade, da qual o sistema de iluminação pública inteligente faz parte.

Hessel observa que a principal função do Centro de Pesquisa da Huawei é o desenvolvimento da CityOS, sistema operacional da cidade, da qual o sistema de iluminação pública inteligente faz parte. “Trata-se de uma plataforma de integração que permite que diferentes sistemas fornecidos por diferentes players possam operar, trabalhar em harmonia para o bem da cidade”, afirma o coordenador. Na atualidade, cada serviço tecnológico – câmeras de monitoramento da cidade, por exemplo – oferecido por uma empresa apresenta um sistema operacional próprio. A intenção do Centro é criar uma plataforma comum, como um Android ou Linux, que una as diferentes linguagens e facilite a vida do município na hora de contratar uma empresa para implantação de um novo sistema. “Assim, a prefeitura pode escolher o melhor fornecedor naquele momento, já que a plataforma vai ser aberta para qualquer tecnologia”, esclarece.

Além de o sistema de iluminação pública inteligente, o Centro de Pesquisa testou o CityOS através de um sistema de presença em uma escola estadual do Rio Grande Sul, mas o objetivo é expandir estes módulos para outras aplicações da cidade. “Queremos que o Centro se torne uma referência para a implementação de sistemas inteligentes na cidade de Porto Alegre”, diz Hessel. “A ideia é trabalhar em parceria com a cidade, descobrir quais os serviços prioritários e ajudar as cidades nestes serviços”, conclui.


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