O adensamento da cadeia produtiva do setor nuclear pode gerar mais empregos e renda para os brasileiros

Por: Raul Lycurgo Leite

Começo este artigo com uma citação de Alexander Graham Bell, o inventor do telefone: “Quando uma porta se fecha, outra se abre. Mas muitas vezes nós ficamos olhando tanto tempo, tristes, para a porta fechada que nem notamos que se abriu outra pra nós”.

Na “COP28”, a Conferência Mundial do Meio-Ambiente que ocorreu no final de 2023, em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, mais de 23 países se comprometeram a triplicar a produção da energia nuclear até 2050 para cumprir as metas de descarbonização. Sem isso, ou seja, sem a energia nuclear, a meta de emissões de gases de efeito estufa para 2050, pactuada no Acordo do Clima de Paris de 2015, simplesmente não será atingida. E nesta lista de países que investirão na energia nuclear estão: EUA, Reino Unido, Canadá, França, Japão, Emirados Árabes Unidos, Finlândia, Coréia do Sul, Suécia, Holanda e Hungria, dentre outros.

E não faltarão recursos financeiros, pois, já na largada, mais de 14 instituições financeiras expressaram apoio ao chamado à ação para triplicar a capacidade global de energia nuclear até 2050, dentre elas: Abu Dhabi Commercial Bank; ares Management; Bank of America; Barclays; BNP Paribas; Brookfield; Citi; Credit Agricole CIB; Goldman Sachs; Guggenheim Securities LLC; Morgan Stanley; Rothschild & Co.; Segra Capital Management e Société Générale.

Hoje são mais de 450 centrais nucleares operando no mundo e outras 60 sendo construídas. Só a China pretende construir, até 2035, mais 150 novas centrais nucleares.

Com o compromisso assumido pelas diversas nações na “COP28”, triplicar os investimentos em energia nuclear significará, especialmente para o Brasil, uma “larga avenida” de oportunidades. Afinal, somos um dos pouquíssimos países do mundo que, além de ter o conhecimento e o domínio de toda a cadeia/ciclo do combustível nuclear, ainda temos enterrado em nosso subsolo o urânio.

Temos a 8ª maior reserva de urânio do mundo e apenas estudamos, na década de 1970, 1/3 do nosso território. Ou seja, com as novas tecnologias e com o mapeamento do território brasileiro integral, certamente podemos subir – e muito – neste ranking, chegando, talvez, a ter a maior reserva de urânio do mundo.

E é por isso que o Ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, recentemente disse que o Brasil pode ter um novo “pré-sal”, fazendo referência às reservas de urânio em nosso território.

E o urânio, após complexo processo de enriquecimento, é o combustível usado nestas usinas nucleares. Ou seja, podemos nos tornar exportadores de combustível nuclear para todas estas usinas mundialmente. Diga-se de passagem, produto de alto valor agregado. Apenas para se ter pequena noção, realizamos troca de combustível em nossas usinas nucleares uma vez por ano e, em cada troca, substituímos 1/3 do combustível existente no núcleo do reator. Para Angra 1, são 20.000kg de combustível nuclear por ano e, para Angra 2, são 30.000kg. Anualmente, gastamos mais de R$1.5Bi. Isso, inclusive, contribuiria, e muito, na nossa balança comercial.

É importante mencionar ainda que, para cada R$1 bilhão de investimentos na geração de energia nuclear, o impacto disso no PIB é de R$2 bilhões, sendo 80% desse impacto no estado do Rio de Janeiro, gerando mais de 22 mil empregos no Brasil e, ainda, um aumento de R$3,1 bilhões na cadeia produtiva brasileira.

Esses e outros dados são resultado de estudo realizado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Não bastasse tudo isso, o mundo está focado no aumento expressivo da energia nuclear, não apenas para garantir as metas de emissão dos gases de efeito estufa em 2050, mas também para fazer frente à necessidade de muita energia limpa, firme e de base que será necessária para suportar a revolução tecnológica, já em andamento com a inteligência artificial, seus data centers e a massiva necessidade de energia que eles demandam.

O Departamento de Energia dos EUA, em junho de 2024, disse que os EUA precisarão de 900GW de energia firme, de base e limpa para conseguir atingir a meta de “net-zero emissions” até 2050. O desafio é gigantesco! O Brasil possui 200GW de potência instalada centralizada. Ou seja, somando todas as fontes de geração de energia elétrica no Brasil, temos 200GW. Assim, o desafio norte americano é construir, até 2050, um parque adicional de geração de energia elétrica firme, de base e limpa, de 4,5x o que existe no Brasil hoje.

A Agência Internacional de Energia, em seu Relatório 2024 – Analysis and Forecast to 2026 – informa que, no mundo, os data centers consumiram, em 2022, 460 TWh de energia e que, estima-se que, em 2026, com o avanço da inteligência artificial, os data centers consumirão mais de 1.000 TWh.

Diversas empresas privadas, dentre elas, Microsoft, Google, Amazon, Oracle, Nvidia começam a explorar o setor da energia nuclear como forma de prover seus data centers com energia limpa, firme e confiável.

Diversos países já anunciaram a retomada da energia nuclear não apenas como forma de garantir energia limpa e firme, mas também para garantir o desenvolvimento e a geração de empregos altamente especializados. 

O parlamento da Suécia deu sinal verde para avançar com os planos de construir novas usinas nucleares. A Ministra das Finanças da Suécia, Elisabeth Svantesson, disse: “Isso cria as condições para a energia nuclear (…) Precisamos de mais produção de eletricidade, precisamos de eletricidade limpa e precisamos de um sistema energético estável.” Já a Ministra do Clima da Suécia, Romina Pourmokhtari, fala em construir 10 grandes centrais nucleares nos próximos 20 anos. 

O Reino Unido pretende aumentar a geração nuclear em 4 vezes até 2050. O Primeiro-Ministro do Reino Unido, Rishi Sunak, disse recentemente: “o nuclear é o antídoto perfeito para os desafios energéticos que a Grã-Bretanha enfrenta – é verde, mais barato a longo prazo e garantirá a segurança energética do Reino Unido a longo prazo” e que, até 2030, o setor nuclear britânico precisará de mais de 123.000 novos trabalhadores. 

Na Índia, a Ministra das Finanças, Nirmala Sitharaman, disse que a energia nuclear deverá formar uma parte “muito significativa” da matriz energética para transformar a Índia em uma nação completamente desenvolvida até 2047, sendo que, por lá, já são 23 centrais nucleares em funcionamento e mais 7 em construção. E, para atingir seu objetivo, a Índia planeja convidar empresas privadas para investir cerca de US$ 26 bilhões em seu setor de energia nuclear.

Na mesma direção está a Itália. O Ministro do Meio Ambiente e Segurança Energética italiano, Gilberto Pichetto Fratin, disse: “Para termos garantia de continuidade na energia limpa, precisamos inserir uma cota de energia nuclear. Tecnologias renováveis como a energia solar e eólica não podem fornecer a segurança de que precisamos”. Mas a ITÁLIA não pretende que investimentos públicos sejam a mola propulsora desta mudança. O próprio Ministro Gilberto Pichetto, em uma entrevista ao jornal La Repubblica, disse que “Possivelmente serão os distritos industriais ou empresas individuais de energia que se equiparão com reatores de quarta geração menores. O Estado será apenas um regulador”.

O Departamento de Energia dos EUA, em comunicado de 08/10/2024, afirma que os EUA já estão investindo no adensamento da cadeia produtiva do combustível nuclear das atuais e futuras usinas nucleares deles.

“Construir uma cadeia de fornecimento de combustível nuclear nacional forte e confiável ajudará nossa nação a atingir as ambiciosas metas ao mesmo tempo em que protegerá o meio ambiente e criará empregos bem remunerados e de alta qualidade”, disse o vice-secretário de Energia dos EUA, David M. Turk. 

“O governo federal sabe que a energia nuclear é essencial para acelerar o futuro da energia limpa dos Estados Unidos”, disse o assistente do Presidente BIDEN e conselheiro nacional do clima Ali Zaidi. “Aumentar nosso fornecimento doméstico de urânio não apenas promoverá a agenda climática histórica do presidente Biden, mas também aumentará a segurança energética dos Estados Unidos, criará empregos bem remunerados e fortalecerá nossa competitividade econômica. O caminho para maior segurança energética e mais soluções climáticas passa por investimentos como esses, feitos em escala histórica pelo presidente Biden. É uma boa notícia para nossa economia, para a força de trabalho sindical dos Estados Unidos e para nosso planeta.

Será que só nos EUA, Suécia, Reino Unido, Índia, Itália etc que o adensamento da cadeia produtiva da energia nuclear “criará empregos bem remunerados e fortalecerá a cadeia produtiva e a competitividade econômica?”

Isso tudo significa que as nossas oportunidades são gigantescas e em um setor extremamente tecnológico e de alto valor agregado cujo minério – urânio – está enterrado em nosso território, mas é preciso agir e agir rápido para não ficarmos para trás nesta corrida pela energia limpa, firme e confiável e para aproveitarmos as oportunidades no momento certo.

Como diria o escritor William Arthur Ward: “as oportunidades são como o nascer do sol; se você esperar demais, vai perdê-las”.

Sobre o autor:

*Raul Lycurgo Leite é advogado, procurador federal e Presidente da Eletronuclear.

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