As Variações de Tensão de Curta Duração (VTCDs) são fenômenos que, embora ocorram durante um curto intervalo de tempo, podem resultar em expressivos impactos sobre redes de transmissão/distribuição ou consumidores. Não obstante, o tema se apresente contemplado na legislação nacional através dos denominados Fatores de Impacto (FI), que quantificam as ocorrências, não há, todavia, qualquer menção à questão da responsabilidade do evento. No contexto de procedimentos metodológicos para a identificação da origem destes eventos, a literatura relata esforços visando a proposição de estratégias para tal fim.
Na publicação [1] é estabelecida uma estratégia baseada em medições realizadas em vários barramentos da rede. A abordagem baseia-se na análise da tensão residual monitorada em cada barramento (a tensão restante associada ao VTCD), o instante que ocorre o evento, e a duração do mesmo. Outro autor [2] explora um procedimento baseado na Transformada Rápida de Fourier. Nesta, as tensões e correntes são monitoradas e analisadas, levando à identificação da origem do evento. Já em [3] encontra-se um procedimento fundamentado no comportamento do fluxo de potência antes e durante o afundamento de tensão analisando-se os valores obtidos nos quadrantes real e imaginário, requerendo, para tanto, as impedâncias das componentes de sequências para a sua aplicação. Em [4], há uma abordagem a partir de medições de corrente, potência ativa e distorção harmônica. As variáveis são medidas antes, durante e, em alguns casos, após os eventos.
A referência [5] usa um procedimento baseado nas medições dos valores de tensão e corrente de sequência-negativa contando com o conhecimento das respectivas impedâncias. Analisando o período durante a ocorrência das VTCDs, em [6], é apresentada uma proposta que requer grandes esforços computacionais. Por fim, em [7], encontra-se um procedimento baseado nas impedâncias pré e pós falta, através das quais é feita uma análise da parte real e imaginária destas grandezas, e seus correspondentes ângulos de fase. Não obstante tais estratégias, o fato é que, até o momento, não há registros de suas aplicações e eficácias dos procedimentos supra postos.
Já em [8], encontra-se uma proposta metodológica embasada no emprego de indicadores relacionados com os fatores de desequilíbrios de tensão e corrente, e seus processos de transferência, através dos transformadores de conexão entre os agentes. Esta estratégia evidenciou resultados promissores ao propósito estabelecido, os quais foram obtidos através de simulações computacionais e experimentos laboratoriais, tendo-se constatada, numa primeira instância, sua efetividade e perspectivas de aplicação em campo.
O processo em questão se baseia nas medições de tensões e correntes trifásicas dos lados primário e secundário do transformador de conexão interligando, por exemplo, uma concessionária a uma unidade consumidora, ou, uma rede de transmissão a um sistema de distribuição, como ilustra a Figura 1. Uma vez medidas as tensões e correntes trifásicas, seus correspondentes fatores de desequilíbrio de sequência negativa e zero são prontamente calculados, seguido de uma análise comparativa dos valores encontrados, de um e outro lado do transformador. Esta correlação se apresenta como fundamento para o estabelecimento da estratégia para a identificação da origem da VTCD, ressalvando que o fenômeno ocorrido deve possuir uma natureza desequilibrada.
Figura 1 – Interpretação física dos princípios da metodologia estabelecida em [8].
Objetivando esclarecer a proposta contida em [8], através de um sistema elétrico modelado, cujas características não são aqui transcritas, procedeu-se o processo de análise através de mecanismos computacionais e experimentais. Os resultados indicativos da correlação entre os FDs das tensões e correntes, de um e outro lado do transformador, encontram-se sintetizados na Tabela 1. A lógica comparativa entre os correspondentes FDs de tensões e correntes, de um e outro lado do transformador, para distintos tipos de conexão, como indicado, se mostra com características promissoras à identificação da origem dos fenômenos manifestados. Destaca-se que as grandezas indicadas pelos índices “2”, “0”, “v”, “i”, “p” e “s” estão atrelados com a sequência negativa, zero, tensão, corrente, primário e secundário, respectivamente.
Tabela 1 – Correlação entre os FDs de tensão e corrente determinados dos lados primário e secundário de transformadores com conexões típicas e para distintos tipos de desequilíbrio para as VTCDs
Tipo de conexão do transformador | Origem da VTCD | FD2Vp x FD2Vs | FD0Vp x FD0Vs | FD2Ip x FD2Is | FD0Ip x FD0Is |
Δ-Yn | primário | Igual | Diferente ou não-existente | Igual | Não-existente |
secundário | Diferente | Diferente ou não-existente | Igual | Diferente ou não-existente | |
Y-Δ | primário | Igual | Diferente ou não-existente | Igual | Não-existente |
secundário | Diferente ou não-existente | Diferente ou não-existente | Igual ou não-existente | Não-existente | |
Yn-Yn | primário | Igual | Igual ou não-existente | Igual | Diferente ou não-existente |
secundário | Diferente | Diferente ou não-existente | Igual | Igual ou não-existente |
Do exposto, segue que o processo de transferência dos FDs, de um para o outro lado do transformador, quando da ocorrência das VTCDs do lado primário, apresentam os mesmos valores. Por outro lado, quando o evento é advindo do lado secundário, os correspondentes fatores de desequilíbrios são distintos. Assim, os fatores de desequilíbrios de tensão de sequência negativa, obtidos através de medições dos módulos das tensões fase-fase, se revelam-se como grandezas fundamentais à determinação da origem do fenômeno aqui considerado. Quanto aos fatores de desequilíbrio de sequência zero, os mesmos não modificam as constatações supra feitas, mas apenas oferecem uma base complementar para o processo de identificação da responsabilidade da origem do distúrbio em questão.
Autores:
Por Adrian Ribeiro Ferreira, M.Sc – Trainee do Grupo Energisa, Doutorando da Universidade Federal de Uberlândia e Pesquisador do NQEE-UFU;
José Carlos de Oliveira, PhD – Prof. colaborador da Universidade Federal de Uberlândia;
Paulo Henrique Oliveira Rezende, Dr. – Prof. da Universidade Federal de Uberlândia e Pesquisador do NQEE-UFU.
Referências:
[1] C. Noce, M. De Santis, P. Varilone, and P. Verde, “Comparison of Methods Using only Voltage Measurements for Detecting the Origin of Voltage Sags in the Modern Distribution Networks,” IEEE, p. 6, 2018, doi: https://doi.org/10.1109/ICHQP.2018.8378844.
[2] H. Shareef, A. Mohamed, and A. A. Ibrahim, “Identification of voltage sag source location using S and TT transformed disturbance power,” J. Cent. South Univ., vol. 20, pp. 83–97, 2013, doi: https://doi.org/10.1007/s11771-013-1463-5.
[3] F. O. Passos, “Localizador da Fonte de AMTs Baseado nas Medições de Tensões de Fronteira,” Universidade Federal de Itajubá – UNIFEI, 2015.
[4] S. J. Ahn, D.-J. Won, I.-Y. Chung, and S. Moon, “A New Approach to Determine the Direction and Cause of Voltage Sag,” J. Electr. Eng. Technol., vol. 3, pp. 300–307, 2008, doi: 10.5370/JEET.2008.3.3.300.
[5] W. Kanokbannakorn, T. Saengsuwan, and S. Sirisukprasert, “Unbalanced voltage sag source location identification based on superimposed quantities and negative sequence,” 2011. doi: 10.1109/ECTICON.2011.5947915.
[6] Y. Mohammadi, R. C. Leborgne, and B. Polajžer, “Modified methods for voltage-sag source detection using transient periods,” Electr. Power Syst. Res., vol. 207, 2022, doi: https://doi.org/10.1016/j.epsr.2022.107857.
[7] V. B. Núñez, X. B. Moliner, J. M. Frigola, S. H. Jaramillo, J. Sánchez, and M.Castro, “Two Methods for Voltage Sag Source Location” in International Conference on Harmonics & Quality of Power, 2008, p. 6.
[8] A. R. Ferreira, B. M. Gianesini, J. C. d. Oliveira and P. H. O. Rezende, “An Approach for Assigning Responsibilities of Short-Term Voltage Variations in Electrical Power Systems,” in IEEE Access, vol. 11, pp. 7751-7758, 2023, doi: 10.1109/ACCESS.202