Plugues e tomadas pelo mundo

Por Flávia Lima
Edição 59 – Dezembro/2010

Existem no mundo mais de 100 modelos de plugues e tomadas elétricas. Embora a tentativa de se instaurar um padrão universal tenha sido, até agora, frustrada, a expectativa é de que a globalização consiga maior adesão da unificação em médio ou longo prazo.

 

 

Para os viajantes de plantão, recarregar o celular ou a câmera fotográfica quando se está de passagem em diversos países é sempre uma grande complicação. Além dos preparativos que toda viagem exige, quando o roteiro é fazer um tour pela Europa, por exemplo, quase nunca nos lembramos do adaptador de tomada, mas quando lá estamos nos damos conta do quão complicado é utilizar a eletricidade do velho continente. Isso porque, mesmo que você leve um adaptador que encaixe na tomada de Paris, fatalmente, ele não poderá ser utilizado em Londres. Se passar pela Alemanha, lá também terá de procurar um adaptador local. E se for para outro continente, a situação se complicará ainda mais. Como as tensões em que um ou outro país opera também variam, além do adaptador de plugues, será necessário ainda um transformador de tensão para que nenhum acidente com o equipamento ou com a tomada ocorra.

Isso acontece porque cada país possui seu padrão de plugues e tomadas. Alguns países, pela proximidade e/ou afinidade, acabaram, ao longo do tempo, incorporando padrões semelhantes, mas, via de regra, cada mercado instituiu o seu modelo. Especialistas dizem que, com a globalização cada vez mais presente, a tendência é que haja um padrão universal, mas, para se chegar nesse ponto, ainda há uma grande fila de questões a serem resolvidas, envolvendo técnica e interesses políticos e mercadológicos. Isso sem contar a mudança de cultura e de história que envolve a adoção desses padrões por cada uma das regiões.

Vamos à questão histórica. Quando a eletricidade foi introduzida na vida doméstica, no fim do século 19, era empregada basicamente na iluminação. Logo que outras aplicações domésticas começaram a aparecer, em meados do século 20, elas foram introduzidas à técnica já existente para os sistemas de iluminação, assim, a princípio, esses novos produtos eram conectados por meio de adaptações de encaixe ao soquete de iluminação. Mais tarde é que começaram a surgir outros tipos de conexões.

A primeira utilização de plugues de encaixe na forma de dois pinos machos em tomada fêmea para uso em aparelhos eletrodomésticos teria sido inventada em 1904 pelo
norte-americano Harvey Hubbell, que patenteou a invenção. A ideia baseava-se, essencialmente, em conectar invenções elétricas em soquetes de lâmpadas. Conforme ele mesmo declarou, sua invenção tinha o propósito de permitir que pessoas leigas pudessem utilizar eletricidade em suas casas sem grandes riscos. “Minha invenção tem o objetivo de prover um plugue de conexão com custo de construção reduzido ao mínimo, que evite faíscas ao fazer a conexão, assim, a eletricidade pode ser utilizada por pessoas sem conhecimento elétrico ou habilidades no uso da iluminação, de motores, de aparelhos de aquecimento, de instrumentos cirúrgicos e outros aparelhos que requeiram o uso da eletricidade”, diz a patente de número 774.250, de 8 de novembro de 1904.

Mais tarde, ele mesmo adaptou o seu design original, separando o plugue: uma parte dele poderia ser deixada na tomada, enquanto na outra ele acrescentou dois pinos, podendo ser separada da tomada. Esse modelo passou a ser fabricado nos Estados Unidos na década de 1920 e, em 1928, esse desenho foi novamente adaptado por Philip Labre, que incluiu o terceiro pino, dedicado ao aterramento. Este desenho sofreu inúmeras modificações ao longo dos anos e, atualmente, está presente em todo o mundo com pinos achatados e/ou redondos.

De modo geral, os plugues e as tomadas são divididos em dois grandes grupos de acordo com a tensão de cada região: 110-127 V e 220-250 V. A história remonta aos experimentos com corrente contínua e corrente alternada e à conhecida disputa entre dois grandes cientistas, Thomas Edison e Nikola Tesla, os grandes precursores das correntes, respectivamente citadas. A tecnologia de Edison empregava tensão de 110 V, mas as pessoas começaram a perceber que a tensão em 220 V não era má ideia. Nos Estados Unidos, acabou prevalecendo a tensão de 110 V e, na Europa, uma empresa alemã chamada BEW exerceu seu monopólio e adotou a frequência de 50 Hz e tensão de 240 V, levando o padrão para o restante do continente. O mundo então se dividiu. No Brasil, por exemplo, as duas tensões estão presentes em uma mesma instalação. Assim, os plugues e tomadas eram desenhados de acordo com a tensão a que atendiam.

Enquanto os plugues de dois e três pinos tornavam-se conhecidos pelo mundo, muitos países e fabricantes decidiram não adotar o design norte-americano, preferindo desenhar seus próprios produtos. De acordo com a Comissão Eletrotécnica Internacional (IEC), antes da era da globalização, as companhias se concentravam em atender seus mercados regionais e nacionais, por isso, não havia a necessidade de se preocupar com o que outros países andavam produzindo

Mas essa regra também contou com algumas exceções. Foi o caso da Europa, por exemplo, cuja maioria dos países resolveu adotar um mesmo padrão de plugues e tomadas (com vários modelos), com exceção de alguns países, como Reino Unido, Irlanda e Suíça, que possuem design próprio. O mesmo aconteceu com países da Ásia, África e América, que adotaram padrões semelhantes entre si.

O plugue britânico atual, por exemplo, possui três pinos achatados e grandes, com um fusível em seu interior. Mas nem sempre foi assim. No começo dos anos 1900, toda a região britânica era coberta pela British Standard 546 (Padrão Britânico 546), que inseriu seis versões para o plugue e tomada, todos incompatíveis entre eles. Este sistema funcionou bem até a Segunda Guerra Mundial, quando o país foi atacado pela Alemanha e teve de se reconstruir no meio de uma grande crise de abastecimento de produtos primários – de cobre, especialmente. Isso fez o governo direcionar seus investimentos para economia desses produtos básicos. A criação de um novo plugue acabou minimizando o problema da falta de cobre, já que o padrão desenhado incluía um fusível no seu interior, reduzindo o uso de fios e cabos (de cobre) usados nas caixas de fusíveis das residências. O modelo foi introduzido em 1947 pela British Standard
nº 1363.

Assim como ocorreu com o Reino Unido, cada país desenvolveu seus plugues e tomadas em função das suas necessidades e mercados locais. No caso da Inglaterra, é sabido que o país exerceu controle sobre a Índia por décadas. É natural que o país dominante exerça influências sobre o mercado interno do país controlado e não foi diferente neste caso. A Inglaterra exportava seus produtos e, com eles, seus plugues e tomadas acabaram virando referência. O problema é que a Índia se tornou independente em 1947, quando ainda não havia sido lançado na Inglaterra o novo padrão de plugues, assim, a Índia e outros países como Sri Lanka, Nepal e Namíbia continuaram com o velho padrão e os mantém até hoje. Este exemplo ajuda a entender a variedade de plugues e tomadas encontradas em todo o mundo. Trata-se de uma questão histórica e cultural.

Os Estados Unidos seguem o padrão Nema (Associação Nacional de Fabricantes de Produtos Elétricos). São cerca de 50 desenhos diferentes de plugues e tomadas que variam conforme a combinação entre tensões, correntes e quantidades de pinos. O engenheiro eletricista e consultor Hilton Moreno, que foi presidente da Nema Brasil, explica que essa diversidade existe justamente para que não se conecte um plugue em uma tomada errada, evitando assim acidentes, como choques e dan

os a equipamentos e à tomada.

IEC e a busca por um padrão universal

As primeiras reuniões da IEC a fim de se padronizar os plugues e as tomadas começaram na década de 1930 com representantes de 12 países. Algumas discussões chegaram a ser feitas em algumas cidades europeias, como Paris e Praga, criando comitês técnicos específicos para estudar e criar um padrão universal. Mas por falta de consenso, as conversas foram adiadas para 1940, quando o mundo estava tomado pela Segunda Grande Guerra e as discussões sobre o assunto ficaram de ser retomadas em uma próxima oportunidade.

Somente após a guerra é que os trabalhos recomeçaram. A primeira reunião ocorreu em 1947, em Luzern, na Suíça, organizada pelo Comitê Técnico 23, criado em 1934, no encontro de Praga. Foi nesse período – fim da década de 1940 – que o comitê uniu-se à Comissão Internacional de Regras para Equipamentos Elétricos (CEE, sigla para International Commission on Rules for the Approval of Electrical Equipment) em uma discussão cooperada no intuito de unificar a normalização internacional para tomadas, plugues e conectores. Em 1951, a CEE publicou uma seleção dos plugues e tomadas mais utilizados na Europa, excluindo os empregados no Reino Unido e na Irlanda. Outras publicações surgiram mais tarde, como a Publicação 83 da IEC, lançada em 1957, que reunia os padrões para plugues e tomadas para usos doméstico e geral da Europa, dos Estados Unidos e também do Reino Unido. Era, na verdade, um grande catálogo de padrões utilizados nesses países.

Apesar de todas as dificuldades em se chegar a um acordo, visto os entraves políticos e econômicos, os trabalhos continuaram e, em 1970, criou-se o Subcomitê 23C dedicado à discussão de um sistema de plugues e tomadas universais. Foi então que começaram a se pensar o desenho desse novo sistema. A princípio, a ideia que se manteve por anos era empregar apenas pinos achatados nos plugues, mas considerando as diferentes tensões e os padrões pré-existentes, as objeções cresceram e muitos comitês nacionais mostraram-se mais a favor dos pinos redondos. Outro problema sério encontrado foi como definir uma solução única para sistemas de até 127 V e de até 250 V. Depois de longas e, por vezes, amargas discussões, o subcomitê finalmente chegou a uma solução viável. Formulada e publicada em 1986, a norma técnica IEC 906-1 (agora IEC 60906-1) definiu pinos redondos para instalações de até 250 V e o documento para instalações de 125 V recomendou o uso de pinos achatados – já conhecidos nos Estados Unidos – e foi publicado em 1992 como IEC 906-2 (agora IEC 60906-2).

Nos anos 1990, o Comitê Europeu de Normalização Eletrotécnica (Cenelec) tentou harmonizar em toda a Europa um sistema único de plugues e tomadas. No entanto, além das dificuldades técnicas, os interesses políticos e comerciais acabaram pondo fim às discussões.

Os documentos foram elaborados como uma sugestão IEC, especialmente, para os países que não possuem um padrão próprio normatizado, mas, desde que a IEC publicou as normas sugerindo um padrão internacional, muitos países revisaram os seus documentos normativos de plugues e tomadas, mas não as consideraram.

As normas estão disponíveis para qualquer país que queira adotá-las. Entretanto, apesar de haver algumas iniciativas no sentido de aplicar a regra internacional, apenas o Brasil adotou um padrão baseado nos documentos da IEC – com algumas adaptações. O gerente do Departamento de Tecnologia e Política Industrial da Abinee, Fabian Yaksic, revela, no entanto, que alguns países latino-americanos, como o Peru e o Chile, estão se organizando e pensando em algumas mudanças em seus respectivos sistemas e podem, para isso, considerar as normas IEC como referência.

Sobre o assunto, a responsável pela comunicação da IEC, Gabriela Ehrlich, declarou recentemente que todos os países acabam investindo em seus sistemas próprios e é muito difícil convencê-los a adotar o padrão universal. Nesse sentido, diversos especialistas pelo mundo e a própria IEC não estão muito confiantes de que isso vá um dia acontecer, embora a globalização cada vez mais intensa possa ser uma forte estimuladora desse processo.

Na opinião de Yaksic, “o maior fabricante é que domina o mercado”. Segundo ele, a preocupação com os padrões internacionais é recente, diferente de antigamente, quando as regras eram ditas pelos maiores fabricantes. “Lamentavelmente, existem mais de 110 tipos de padrões diferentes no mundo. Mesmo na Europa, encontramos uma variedade muito grande e isso acontece porque a maior parte dos países já tinha suas normas e, por questões econômicas, os países não aceitaram o novo padrão elaborado pela IEC”, completa.

A dificuldade em se padronizar existe porque há a necessidade de mudanças em um mercado que já está instalado. A questão é, além de política, econômica, pois todos – fabricantes, distribuidores e consumidores – terão de investir nos novos plugues e tomadas, embora com prazos distintos. Talvez em um longo prazo, a globalização alcance tamanha dimensão em que essa reestruturação seja praticamente inevitável.

O padrão brasileiro

Desde janeiro de 2010, os fabricantes brasileiros estão proibidos de comercializarem plugues e tomadas elétricas que não estejam em conformidade com o novo padrão estabelecido pela ABNT NBR 14136:2002. A exigência foi determinada pela Resolução nº 11 do Conselho Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Conmetro), anunciada em dezembro de 2006. Os comerciantes têm até julho de 2011 para liquidarem seus estoques dos produtos fora do padrão.

O novo formato brasileiro foi inspirado nas normas IEC 60906-1 e IEC 60906-2, que instituem um padrão universal de plugues e tomadas, mas com algumas modificações. O encaixe do plugue tem formato hexagonal e as tomadas têm um baixo relevo (rebaixamento) para que os pinos fiquem acomodados de forma a não se ter contato com as partes metalizadas. Os plugues foram padronizados em dois modelos: pino redondo com dois terminais e pino redondo com três terminais (sendo um deles dedicado ao aterramento). Além disso, os pinos podem ser de dois diâmetros: 4 mm (para os que operam em até 10 A) e 4,8 mm (para até 20 A).

Novo padrão brasileiro, inspirado nas normas IEC, foi lançado em 2002 e tornado compulsório em 2006. Em julho de 2011 vence o último prazo de adequação para os comerciantes (para plugues e tomadas incorporados).

Diferentemente do que foi estabelecido pelas normas IEC, que prevêem pinos achatados para os plugues de até 125 V, a norma brasileira estabelece apenas o uso de pinos arredondados para as duas tensões. Dessa maneira, os pinos chatos deixam de existir com o novo padrão, perman

ecendo apenas os terminais redondos.

Este novo padrão adotado no Brasil substitui o modelo de tomada que era popularmente já conhecido no País como “universal”. Isso porque a tomada antiga era adaptada para receber os plugues de eletrodomésticos importados tanto da Europa (pinos redondos) quanto dos Estados Unidos (pinos achatados).

Fabian Yaksic conta que, por conta da coexistência dos dois formatos, o europeu e o americano, o mercado sentia a necessidade de se padronizar o dispositivo e, desde 1984, que se discute o assunto nas comissões técnicas, responsáveis pelas normas técnicas brasileiras. “Estávamos preocupados com a questão da segurança. Em algumas instalações europeias e norte-americanas já havia o fio-terra e precisávamos fazer o mesmo”, conta.

Ele explica que o formato proposto pela IEC foi considerado mais seguro por conta do baixo relevo que evita o contato com os pinos. “Constatou-se também que era muito mais fácil utilizar os pinos redondos para seguir uma padronização só, seja com dois ou três pinos”, avalia.

No Brasil, a nova padronização aconteceu graças ao envolvimento do Inmetro, que publicou uma portaria exigindo a certificação compulsória desses produtos.

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