Edição 89 – Junho de 2013
Por Ana Carolina Salomão, Nelson Kagan, Isaque Gondim, Paulo Rezende, José Carlos Oliveira e José Rubens Macedo
Grande número de pedidos de ressarcimento por danos em equipamentos elétricos e eletrônicos tem, nos últimos tempos, merecido a atenção das concessionárias de energia, agências de regulação, consumidores e outros órgãos governamentais. Tais preocupações estão associadas não apenas com os volumes financeiros envolvidos, mas, sobretudo, com os impactos sociais atrelados com solicitações, decisões, conflitos e outras questões que envolvem a relação entre as concessionárias de serviços públicos de distribuição e seus consumidores. Por conseguinte, o tema, como um todo, vem motivando investigações direcionadas à melhoria do processo de análise das questões em foco, domínio e difusão do conhecimento da correlação entre os distúrbios e efeitos, assim como o fornecimento de diretrizes para o oferecimento de produtos que possuam um maior nível de suportabilidade diante dos distúrbios típicos nas redes elétricas.
De fato, a primeira destas frentes aponta no sentido do estabelecimento de um processo avaliativo dos pedidos de indenização de forma justa e coesa; a segunda visa à obtenção de dados que esclareçam sobre a relação entre as solicitações térmicas e dielétricas sobre os equipamentos; e a terceira contempla aspectos relacionados com melhorias da fabricação dos diversos componentes presentes nas instalações residenciais, comerciais e industriais, bem como a utilização de dispositivos mitigadores para minimizar os efeitos associados aos possíveis distúrbios ocorridos nas redes elétricas.
Buscando subsídios para a matéria em pauta, um dos balizadores para as prováveis controvérsias está alicerçado nas orientações da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), nos procedimentos das empresas e, porque não dizer, na experiência e no bom senso que norteiam as soluções de conflito. Não obstante, a busca por pareceres consistentes, os métodos comumente utilizados não encontram, via de regra, sustentação em princípios científicos ou técnicos e, diante desta situação, muitas vezes ocorrem incompreensões e insatisfações quanto aos pareceres finais.
Da argumentação acima desprende a necessidade do desenvolvimento
de procedimentos sistematizados, em que pese o equilíbrio entre o emprego de recursos computacionais atrelados com ensaios laboratoriais, os quais, uma vez combinados, podem produzir ferramentas confiáveis destinadas a balizar as decisões das concessionárias quanto aos pedidos de ressarcimento de danos. Assim agindo, acredita-se, serão viabilizados meios para minimizar os desgastes das empresas com os consumidores e ainda a quantidade e os altos custos associados com as demandas judiciais. De fato, a concordância ou contestação dos pedidos encaminhados para análise torna-se extremamente difícil, restando às concessionárias apenas a verificação do nexo causal e a suposição da severidade dos impactos do evento ocorrido sobre os produtos reclamados.
Dentro deste contexto, o presente artigo se apresenta com o objetivo de realçar a relevância do assunto por alguns exemplos. Uma vez destacada a expressão dos problemas, são tecidos comentários sobre a regulamentação da matéria e dos procedimentos empregados pelas empresas até a emissão de um parecer sobre um determinado pedido de indenização.
Visando uma sistematização do processo de análise, apresenta-se também uma síntese de outros meios, fundamentados em uma análise criteriosa em que pese a isenção de interesses de uma ou outra parte e ainda em consonância com os aspectos legais que norteiam o assunto.
Uma visão qualitativa e quantitativa sobre os pedidos de indenização no Brasil
Visando oferecer informações gerais sobre o tema em foco, esta seção encontra-se direcionada para uma caracterização da relevância da matéria dentro do cenário brasileiro. Neste particular ressalta-se que os resultados aqui sintetizados expressam grandezas qualitativas e quantitativas relacionadas aos pedidos de indenização em nível nacional durante o ano de 2010, e alguns dados particulares atrelados com o processo aplicado no âmbito de uma empresa distribuidora de energia. Iniciando, a Figura 1, proveniente da Aneel, expressa aspectos quantitativos
Qualidade de energia
sobre o número de solicitações encaminhadas para análise da totalidade das empresas distribuidoras no país. Os números são considerados parciais e representam a situação vivenciada ao longo do ano de 2010 para apenas 30% das empresas nacionais. A importância do tema quanto a sua relevância para as partes envolvidas – a saber, consumidores, concessionárias e agência reguladora – fica latente pelos números envolvidos. De fato, os registros de solicitações apontam para cerca de 260.000 reclamações de pedidos de ressarcimento, das quais, aproximadamente 45% foram julgados procedentes e 55% improcedentes. Vale observar que a síntese apresentada compreende 18 empresas distribuidoras, enquanto o Brasil possui 64 concessionárias atreladas à distribuição da energia elétrica.
2010 – 18 empresas distribuidoras – fornecido pela Aneel.
De modo particular, a Figura 2 ilustra os principais equipamentos contemplados nos processos de indenização para uma empresa de grande porte. A diversidade de produtos fica evidenciada e, por conseguinte, constata-se que a grande maioria envolve eletrodomésticos de custo mais elevado, fato este que, em atenção aos números financeiros, conduz a um custo estimado de 350 reais por produto indenizado.
Diante do número de solicitações e dos custos associados com o reparo ou substituição dos equipamentos cujos pedidos foram julgados procedentes, mais uma vez, objetivando ilustrar os custos associados com o assunto contemplado neste artigo, a Figura 3 apresenta os valores totais dos ressarcimentos feitos pela mesma empresa acima referenciada ao longo dos últimos quatro anos. Mais uma vez, fica evidenciado que os valores financeiros são significativos e a taxa de crescimento das solicitações de indenização se apresenta com um crescimento
exponencial. Estes argumentos, somadas as ponderações anteriores, refletem, de forma clara e inequívoca, a relevância do tema e a importância da busca por mecanismos legais e técnicos para a
Complementarmente, a Figura 4 mostra a origem dos supostos fenômenos aos quais estariam vinculados, em sua maioria, os pedidos de indenização. Como pode ser visto, as descargas atmosféricas e os religamentos automáticos constam como as principais causas das reclamações direcionadas às distribuidoras de energia elétrica. Não obstante, a correlação entre tais distúrbios e os danos a eles atribuídos, certamente, constituir-se-ia ainda em motivos para discussões e avaliações mais criteriosas, não bastando a existência destes para uma justa correlação entre causas e efeitos. Isso tem provocado um conjunto de ações de ordem regulamentadora, métodos de análise, processos e outros aspectos diretamente afetos ao assunto.
Previsto pelo ordenamento jurídico vigente, sobretudo o que preceitua a Constituição Federal, não restam dúvidas de que as pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos, dentre as quais se encontram inseridas as concessionárias de energia elétrica, responderão pelos danos a outrem ocasionados. Assim sendo, emerge cristalino que as empresas privadas, quando lhes é atribuído o dever de executar os serviços de interesse público, seja por concessão, permissão ou autorização, respondem pelos danos causados pela falha ou defeito na prestação de seus serviços. Consoante ponderado por Sérgio Cavalieri Filho (ver referências), “quem tem os bônus deve suportar os ônus”, aduzindo que “aquele que participa da Administração Pública, que presta
Abordagem jurídica do tema
A energia elétrica é considerada serviço essencial e, consoante o disposto em Lei, esta deve ser oferecida de maneira adequada e com qualidade. Partindo-se desse pressuposto e, considerando o quanto serviços públicos, usufruindo os benefícios dessa atividade, deve suportar seus riscos, deve responder em igualdade de condição com o Estado, em nome de quem atua”.
Muito embora mereça destaque o entendimento de que adverte que usuário de serviço público não é consumidor sob a ótica jurídica, adota-se no presente estudo o posicionamento de que não dispondo o usuário de serviço público de uma legislação específica que assegure e respalde os seus direitos e obrigações enquanto usuários e, considerando ainda que o Código de Defesa do Consumidor encontra-se em harmonia com o quanto previsto pela Constituição Federal, inclusive tendo sido criado em decorrência de preceito constitucional, deve-se recorrer à aplicação da referida legislação na relação verificada entre as pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos e seus usuários. Além do mais, importante destacar que as normas trazidas pelo Código de Defesa do Consumidor são de ordem pública e interesse social; desse modo, disciplinam os valores básicos de uma sociedade, sendo, portanto, de observância obrigatória.
Essencial ponderar que a mencionada legislação traz em seu cerne a responsabilidade objetiva, segundo a qual se faz prescindível a comprovação da culpa para que se concretize o dever de indenizar. Consoante explicitado por Elena Landau (ver referências), “diante dessa tendência, o legislador veio a de fato contemplar a aplicação do CDC aos serviços públicos”, mas adverte o autor que isso “contudo, não pode levar à sua aplicação indiscriminada a eles”. À luz destes argumentos depreende-se que a legislação consumerista vem sendo aplicada às relações envolvendo usuários de serviços públicos, inclusive naquelas situações envolvendo danos ao usuário em decorrência da prestação do serviço público de energia elétrica, entendimento este que vem sendo ratificado por reiteradas decisões provenientes dos tribunais pátrios.
Finalmente, não se pode olvidar o papel da Aneel na mitigação dos problemas existentes entre as concessionárias de energia elétrica e seus usuários. Com efeito, além da missão regulatória e fiscalizatória atribuída por lei À Aneel, este órgão a competência de expedir os atos necessários ao cumprimento das normas estabelecidas pela legislação em vigor. Dessa
maneira, na resolução de conflitos existentes entre usuários do serviço público de energia elétrica – tidos como consumidores no presente estudo – e as concessionárias de energia elétrica, merece observância o disposto pelas Resoluções normativas editadas pela Aneel, as quais devem estar em perfeita harmonia com o disposto no Código de Defesa do Consumidor e, sobretudo, em consonância com o que dispõe a Constituição Federal, que se sobrepõe a toda e qualquer legislação, tendo em vista a hierarquia de normas existente no ordenamento jurídico pátrio.
Contudo, não obstante seja dispensável a comprovação da culpa, para que se concretize o dever das concessionárias de energia elétrica de indenizar os danos elétricos ocasionados aos consumidores faz-se imprescindível a constatação de alguns pressupostos, quais sejam: o dano efetivamente ocasionado ao consumidor; o ato ilícito, consistente na ação ou omissão por parte do agente causador do dano que viola os direitos causando danos a outrem e o nexo causal entre a conduta por parte daquele que ocasiona danos a outrem e o dano experimentado. Faz-se necessário ponderar, dessa maneira, que em algumas situações a administração pública e as prestadoras de serviços públicos poderão ter por elidida a obrigação de indenizar, ainda que se constatem danos a outrem ocasionados, nos casos em que se vislumbre alguma excludente de responsabilidade civil.
Assim sendo, naquelas situações em que se vislumbre a incidência de alguma das excludentes de responsabilidade civil, constatando-se a ausência do nexo causal entre o dano ocasionado ao consumidor e eventual falha ou deficiência na prestação de serviços pela concessionária de energia elétrica, não há que se falar em dever de indenizar por parte desta.
Ao final, importa destacar que inobstante a legislação vigente
ampare o direito do consumidor em se ver ressarcido por eventuais danos elétricos ocasionados por falha ou defeito na prestação do serviço público de energia elétrica, fazem-se incontestes a
s dificuldades enfrentadas pelos consumidores na obtenção da reparação devida. De outro norte, o total desconhecimento por parte dos consumidores das situações em que de fato estar-se-ia diante de alguma excludente de responsabilidade da concessionária de energia elétrica, não havendo, pois, qualquer obrigação desta última em proceder às indenizações pleiteadas, leva a crer que se faz premente a uniformização dos procedimentos adotados na análise dos pedidos de indenização por danos elétricos, procedendo-se a uma padronização por mecanismos ou softwares alicerçados em critérios técnicos e científicos da engenharia, capazes de aferir com maior precisão se de fato houve correlação entre a perturbação no sistema elétrico e o dano ocasionado ao consumidor, uma vez que somente em se constatando o nexo causal entre a falha na prestação do serviço público de energia elétrica e o dano alardeado é que se poderia cogitar a indenização correspondente.
Resoluções do agente regulador
Como resultado das questões levantadas, e outros aspectos, sobretudo no que tange aos direitos dos consumidores perante os serviços oferecidos pelas empresas do setor, urge a necessidade da padronização da qualidade mínima dos suprimentos elétricos e a definição de regras para a análise de processos de ressarcimento. Objetivando contemplar este segmento de conhecimento, tanto a Aneel quanto o Operador Nacional do Sistema (ONS), possuem documentos norteadores sobre a normatização dos padrões de fornecimento de energia elétrica, a saber: os Procedimentos de Distribuição e os Procedimentos de Rede.
Focando especificamente a questão dos danos e pedidos de ressarcimento, ressaltam-se documentos já elaborados, a exemplo da Resolução Normativa 61, de 29 de abril de 2004 da Aneel, que foi alterada pela Resolução Normativa 360, de 14 de abril de 2009. Estas estabelecem as disposições relativas ao ressarcimento de danos elétricos em equipamentos instalados em unidades consumidoras, causados por perturbação ocorrida no sistema supridor. Nestas resoluções, verifica-se que os procedimentos adotados estão vinculados apenas ao nexo de causalidade, o qual está definido como o liame causal que determina o vínculo entre o evento causador e o dano reclamado. Isso pode ser observado no artigo 5º, o qual é transcrito a seguir:
“Art. 5º – No processamento do pedido de ressarcimento, a distribuidora deve investigar a existência do nexo de causalidade, considerando inclusive os registros deocorrências na sua rede.”
Procedimentos para a emissão de pareceres sobre as solicitações de ressarcimento
A. Procedimentos vigentes no BrAsil
Os critérios e procedimentos para análise das solicitações de ressarcimento no Brasil estão fundamentados na legislação vigente, segundo os órgãos e documentos citados anteriormente. Esses procedimentos se dividem em dois tipos: procedimentos administrativos e técnicos.
1) Procedimentos administrativos:
Os procedimentos administrativos dizem respeito às documentações e providências que o consumidor reclamante
tem de obedecer para o inicio do processo de pedido de ressarcimento. As principais informações a serem fornecidas por parte do consumidor são:
· Provar por meio de nota fiscal ou declaração firmada que o mesmo é possuidor do equipamento reclamado;
· Informar a data e horário para a qual teria ocorrido o fato que motivou o dano;
· Apresentar laudo técnico e/ou orçamento discriminando o(s) item(s) danificado(s).
No entanto, a empresa distribuidora é obrigada, em um prazo máximo de 30 dias a se pronunciar sobre o requerimento feito, ou, no caso de equipamentos essenciais, a exemplo de refrigeradores ou outros, o prazo é reduzida para 48 horas.
2) Procedimentos técnicos:
Quanto aos procedimentos técnicos, a concessionária deverá, quando necessário, efetuar verificações de maneira a caracterizar de forma inequívoca se a responsabilidade pelos danos reclamados lhe é imputável. Essas verificações consistem em avaliar o comportamento do sistema da concessionária na data e hora alegado pelo consumidor, confrontando com os possíveis registros de ocorrências na rede elétrica, tais como: eventos meteorológicos, manobras na rede, variação de tensão, ação de terceiros dentre outros.
Além disso, pode ser requerida uma inspeção no local da ocorrência, elaborando um documento que identifique a unidade consumidora, o transformador que alimenta, e outras informações relevantes. Pode ser ainda realizada uma inspeção visual da unidade consumidora reclamante para observação da conformidade das instalações com as normas técnicas da concessionária e das normas técnicas de instalações elétricas do país. Neste particular situam-se questões como: tipos de ligação, situação da proteção geral, inexistência e/ou deficiência de aterramento, levantamento da carga instalada, etc. Por fim, o processo pode ainda compreender uma avaliação geral do produto no que tange a sua potência, tensão, marca, tipo, ano de fabricação, proteção existente e as condições físicas em que mesmo se encontra.
A Figura 5 representa o fluxograma resumido do processo descrito anteriormente, em que pese como foco as etapas que constituem os procedimentos técnicos, uma vez que os administrativos são de atribuição do consumidor.
Diante do exposto fica evidenciado que o processo como um todo se apresenta com as fragilidades de mecanismos totalmente baseados na experiência das empresas e oficinas de manutenção para as tomadas de decisão, fato este que tem orientado para a busca de estratégias fundamentadas nos princípios da engenharia elétrica, como será a seguir exposto.
técnica de pedidos de ressarcimento.
B Procedimentos ProPostos PArA emissão de PArecer soBre
Pedidos de ressArcimento
Reconhecidas as limitações atreladas com os mecanismos supramencionados e em consonância com as novas diretrizes propostas pela agência reguladora, o desenvolvimento de outros meios de análise, fundamentos em princípios científicos e tecnológicos empregados no campo da engenharia elétrica, têm despertado o interesse dos diversos agentes envolvidos com a temática em pauta. No contexto brasileiro atual, há dois produtos advindos de projetos de pesquisa e desenvolvimento. Estes são tratados, de forma sumária, na sequência.
1) Proposta de análise via software da Universidade Federal de Uberlândia
Por uma série de trabalhos conduzidos no âmbito da Universidade Federal de Uberlândia, foi obtido um software de análise conhecido por analisador de pedidos de ressarcimento (APR). Este utiliza um programa para promover uma interface amigável entre a configuração da rede e dos distúrbios com o simulador ATP (Alternative Transients Program). A Figura 6 apresenta a estrutura do programa e mostra, em síntese, as
Na sua essência, o recurso computacional em questão busca reproduzir, propagar e correlacionar os distúrbios factíveis de manifestação nas redes elétricas e seus impactos sobre os equipamentos alimentados pelos alimentadores de distribuição ou outros. Neste sentido, ocorrências do tipo: descargas atmosféricas, curtos-circuitos, atuação dos dispositivos de proteção, manobras diversas, etc., podem ser realizados por uma base computacional sólida e amplamente aceita pelas empresas de energia elétrica do Brasil e do mundo.
Alternativamente, informações associadas com medições diretas também podem ser utilizadas para a caracterização da anomalia ocorrida na rede. Por fim, os impactos dos fenômenos são propagados até o ponto de conexão do consumidor reclamante onde os equipamentos danificados são representados por meio de modelos compatíveis com cada produto considerado. Correlacionando as tensões e correntes incidentes em termos de esforços dielétricos e térmicos, torna-se então possível, pela comparação destas solicitações com os padrões de suportabilidade dos dispositivos, constatar ou não a existência do nexo causal e a emissão de um parecer conclusivo sobre a solicitação feita. A
A título de ilustração, a Figura 8 mostra o resultado de análise conduzida para uma situação particular relacionada com um pedido de indenização de um aparelho de som, supostamente atribuído à incidência de uma descarga atmosférica. Para o caso em questão, os níveis de esforços dielétricos superaram os limites de tolerância do equipamento em grandes proporções, fato este que indicaria o deferimento do pleito.
um pedido de ressarcimento.
2) Proposta de análise da Universidade de São Paulo
A ferramenta desenvolvida pela Universidade de São Paulo, obtida pelos estudos efetuados pelo Enerq – Centro de Estudos em Regulação e Qualidade de Energia, incorpora um sistema de consulta dos bancos de dados das companhias para acessar as ocorrências na rede e identificar indícios de situações que podem ter causado perturbações que sejam potencialmente associáveis a danos de equipamentos. Efetua-se, então, a análise das possibilidades de danos em função da instalação que alimenta o consumidor, tipo de equipamento e sua susceptibilidade a perturbações. A estrutura geral do programa de análise é indicada na Figura 9.
Esta evidencia uma linha de procedimentos que se inicia com a solicitação do consumidor, constatação da existência ou não de alguma anomalia operativa da rede de suprimento, identificação da natureza do fenômeno ocorrido e, por fim, é feita uma análise comparativa entre a causa e o efeito. Para tanto, a estrutura comporta um banco de dados envolvendo as solicitações impostas quanto ao seu nível e propriedades e os padrões de suportabilidade admissíveis pelos produtos.
A estratégia compreende, pois, uma correlação entre o tipo de perturbação sobre um determinado aparelho, em que pese a severidade da ocorrência e a suscetibilidade do aparelho em relação a esse tipo de anomalia operativa. No que tange às informações atreladas com as manifestações de fenômenos possivelmente responsáveis pelos danos, estes são advindos das experiências das empresas e do setor elétrico em geral, formando, assim, um banco de dados que viabiliza a caracterização das ocorrências quanto a sua origem e valores.
Quanto aos limites de suportabilidade dos produtos considerados nos estudos, estes são extraídos de ensaios realizados em um laboratório de alta tensão. Confrontando-se os esforços com os níveis admissíveis pelos equipamentos fica estabelecido um mecanismo para a constatação ou não do nexo causal.
Conclusão
Este artigo, associado com a questão do ressarcimento de consumidores por danos elétricos contemplou um tema que cresce em importância em todo o mundo. Muito embora os autores reconheçam a existência de publicações pontuais sobre a matéria, a correlação entre os distintos tópicos atrelados com questões envolvendo fundamentos jurídicos, normalização e métodos de análise coexistem de forma conjugada e os problemas devem ser, pois, tratados dentro desta ótica. Focando especificamente os métodos de análise dos pedidos de indenização, ficou evidenciado que, no Brasil, na atualidade, o assunto ainda é tratado de forma bastante empírica, fato este que, inevitavelmente, pode levar a pareceres equivocados sobre os processos decisórios. Diante disso, o artigo destacou duas estratégias fundamentadas em princípios classicamente aceitos e programas computacionais. Por meio dos métodos de análise apresentados ficou evidenciado que as técnicas propostas primam pela busca de mecanismos eficazes e que importariam na agilização e coerência do processo de análise do nexo causal dos pedidos de indenização por danos elétricos formulados e, por conseguinte, na emissão de pareceres fundamentados em bases sólidas da engenharia.
Agradecimentos
Os autores agradecem o apoio financeiro recebido da Fapemig, Capes e CNPq para as bolsas de mestrado e doutorado, que resultou neste trabalho.
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Este trabalho foi originalmente apresentado durante o último Simpósio Brasileiro de Sistemas Elétricos (SBSE) e contou com suporte financeiro da Fapemig, Capes e CNPq.
*ANA CAroliNA SAlomão e NelSoN KAgAN são da Escola Politécnica, Departamento de engenharia de energia e Automação elétrica da Universidade de São Paulo (USP). iSAqUe goNDim, PAUlo rezeNDe, JoSé CArloS oliveirA, JoSé rUbeNS mACeDo são da Faculdade de engenharia elétrica da Universidade Federal de Uberlândia.