Revisão de métodos e de conceitos referentes ao cálculo de tensões induzidas

Edição 110 – Março de 2015
Artigo: Eletromagnetismo 
Por Sérgio Toledo Sobral e Patrício Munhoz Rojas*

Metodologias utilizadas para o cálculo de tensões induzidas de baixa frequência e conceitos básicos referentes ao assunto.

O conceito de tensão induzida tem sido focalizado desde os primórdios do estudo do eletromagnetismo e do estudo dos circuitos elétricos, sendo o marco mais importante a Lei de Faraday, de 1831, que se referia a circuitos fechados feitos de fios metálicos.

Posteriormente, em 1856, esta lei foi generalizada e incorporada nas equações de Maxwelle. Já em 1857, ela foi aplicada por Kirchhhoff para obter a famosa “equação do telegrafista”, que descreve a propagação de sinais elétricos em uma linha de transmissão, incluindo fios metálicos, percorridos por corrente elétrica e “gaps” isolantes submetidos a tensões elétricas.

Com o desenvolvimento da transmissão de energia elétrica a longas distâncias, por meio de linhas de transmissão em corrente alternada, começou o aperfeiçoamento da teoria de circuitos de baixa frequência e, em 1897, Steinmetz introduziu o conceito de fonte de tensão para representar a tensão induzida ao longo de um fio condutor.

Em novembro de 2009, foi publicado um artigo sobre o assunto, de autoria de engenheiros brasileiros, no Power Delivery do IEEE, o qual suscitou uma controvérsia entre os engenheiros brasileiros que resultou na publicação de três artigos na revista Eletroevolução (do Cigré), os quais veicularam a visão em termos eletromagnéticos, em termos de linhas de transmissão curtas e em termos da teoria de circuitos, respectivamente.

Isso motivou o GT-2 (Grupo de Trabalho 2), que trada da norma ABNT NBR 5419, do Comitê Brasileiro de Energia Elétrica (Cobei) a desenvolver uma pesquisa sobre o tema e a auspiciar testes experimentais para dirimir essas controvérsias.

Como mostra a literatura internacional sobre o tema, a descrição em termos eletromagnéticos é uma descrição válida para qualquer sistema eletromagnético. Se o sistema eletromagnético a ser descrito cumpre certas restrições, sua descrição em termos de linhas de transmissão é uma descrição válida.

Se o sistema eletromagnético a ser descrito, além de cumprir as restrições anteriores, cumpre outras restrições adicionais, sua descrição em termos da teoria de circuitos é uma descrição válida.

O primeiro propósito deste artigo é mostrar que, no caso de sistemas eletromagnéticos que cumpram todas as restrições necessárias, como é o caso de linhas curtas operando em frequências baixas, todas as descrições acima são igualmente válidas e que as metodologias de cálculo com base em qualquer uma dessas descrições, se corretamente aplicadas, devem conduzir aos mesmos resultados.

Um segundo propósito é expor a raiz das principais controvérsias e mostrar como os resultados dos testes experimentais realizados ajudam a dirimir essas controvérsias. O artigo é então organizado da seguinte maneira:

  • Como a tensão no “gap” de uma espira aberta é definida em termos eletromagnéticos e seu valor é calculado, no caso de uma espira assimilável a uma linha de transmissão curta;
  • Como a diferença de potencial entre os terminais do “gap” de uma espira aberta é definida em termos da teoria de circuitos e seu valor é calculado, no caso de uma espira assimilável a uma linha de transmissão curta;
  • Os principais pontos, ao nosso ver, causadores das controvérsias;
  • O teste do Laboratório de Engenharia Elétrica da Universidade Veiga de Almeida (UVA) e como seus resultados iluminam os pontos causadores das controvérsias;
  • O segundo teste do Lactec e os resultados que iluminam os pontos causadores das controvérsias e, finalmente,
  • As principais conclusões.

A Lei de Indução de Faraday aplicada a uma espira aberta

Na formulação do eletromagnetismo em termos da intensidade do campo elétrico (E) e da densidade de fluxo magnético (B), a Lei da Indução de Faraday, quando aplicada a uma espira aberta, diz que a tensão “V32’(gap)” existente ao longo de um caminho no “gap” entre os terminais (3) e (2’) de uma espira aberta (3-0-2’) é causada pela variação no tempo do fluxo magnético que atravessa a área da espira (Ver Figura 1).

Este é o resultado de supor que a tensão ao longo do condutor aberto da espira é nula (ver Anexo 1). Ou seja:

 

No caso especial, porém muito importante, da utilização de circuitos indutores e espiras formados por condutores longitudinais de dimensões muito maiores que as dos condutores transversais (como os mostrados na Figura 1), tanto os circuitos indutores como as espiras podem ser assemelhados a linhas de transmissão.

Assim, pode-se falar da corrente (I), que flui no indutor (1), e da corrente (-I), que flui no condutor de retorno (2). Veja a Figura 1.

Se, além das suposições anteriores, nós supomos que as correntes transversais no circuito indutor estão muito afastadas da espira em consideração, então a tensão no trajeto transversal 3-2’ “V32’(gap)” passa a ser igual à diferença de potencial elétrico entre os terminais (d.d.p.) V(3) – V(2’).

Na Figura 1, a tensão “V32’(gap)”, neste caso igual à d.d.p. V(3) – V(2’), é calculada supondo que os condutores longitudinais do circuito indutor são de comprimento muito maior que o comprimento dos condutores longitudinais da espira e também que a separação entre eles (Ver Anexo 3). A tensão “V32’(gap)” é causada por duas parcelas aditivas:

  • A primeira parcela corresponde à soma contínua dos envolvimentos de fluxo (“flux linkages”) que atravessa a área da espira e é produzida pela corrente (I), que flui no indutor (1).
  • A segunda parcela corresponde à soma contínua dos envolvimentos de fluxo que atravessam a área da espira, fluxo este produzido pela corrente (-I), que flui no condutor de retorno (2).

 
Figura 1 –Tensão ao longo de um caminho no “gap” entre os terminais (3) e (2’) da espira aberta (3-0-2’).

 

Cálculo da d.d.p. no Gap de uma espira aberta utilizando teoria de circuitos

O eletromagnetismo pode também ser formulado em termos do potencial elétrico (V) e do potencial magnético (A) (ver Anexo 1).

No caso que estamos analisando, em que o efeito magnético dos condutores transversais está sendo desprezado e, portanto, as tensões transversais, tanto de modo diferencial como de modo comum, são iguais às diferenças de potencial elétrico (ou d.d.p.s), podemos representar as linhas de transmissão mediante a teoria de circuitos, cujas variáveis de estado são os potenciais elétricos nos nós do circuito e as correntes nos ramos do circuito, as quais são as produtoras de potencial magnético (ver Anexo 2).

Os “gaps” isolantes transversais entre dois nós, nos quais a corrente que entra é diferente da corrente que sai, são representados por capacitores.

Os trechos de condutores longitudinais entre dois nós são representados, seguindo o modelo de Steinmetz [2,3,6], por uma fonte de tensão (que representa o acoplamento indutivo com o exterior) em série com uma impedância própria do trecho, que representa a parte da diferença de potencial entre os terminais do trecho que depende da corrente no trecho, ou seja, representa sua resistência e sua indutância própria (ver Figura 2).


Figura 2 – Representação circuital da espira aberta.

Em geral, ao longo de um trecho condutor, temos de (ver Anexo 1):

 

Então, o valor da fonte de tensão de cada trecho é dado pela tensão induzida ao longo do trecho, devido às fontes externas:

 

Na Figura 3, o valor da fonte de tensão no trecho (3-0) é calculado usando uma expressão deduzida no Anexo 3, supondo que os condutores longitudinais do circuito indutor sejam de comprimento muito maior que a separação entre eles.

No caso de não haver corrente nesse trecho, o valor da fonte de tensão no trecho (3-0) é igual à d.d.p. V(3) – V(0). No Anexo 3, também é mostrada, para o caso de as suposições acima serem cumpridas, uma interpretação do cálculo em termos de enlaces de fluxo, já utilizada na referência [6].

No Anexo 2, é mostrada uma expressão que é utilizável no caso que as suposições acima não sejam cumpridas [4] e [7].


Figura 3 – Cálculo do valor da fonte V30 que representa a tensão induzida ao longo do condutor (3-0).

Utilizando as suposições acima mencionadas, na Figura 4 é mostrado o cálculo do valor da fonte de tensão no trecho (2’-0) que, no caso de não existir corrente nesse trecho, é igual à d.d.p. V(2’) – V(0). A Figura 5 mostra que a soma das d.d.p.s induzidas ao longo dos trechos (3-0) e (2’-0) produzem uma d.d.p. V(3) – V(2’) do mesmo valor que o calculado, utilizando o processo mostrado na Figura 1.

Uma grande vantagem da utilização da teoria de circuitos é que, ao permitir calcular o potencial em todos os nós de interesse, permite calcular facilmente a diferença de potencial entre os terminais de qualquer ramo de interesse.


Figura 4 – Cálculo do valor da fonte V2’0 que representa a tensão induzida ao longo do condutor (2’-0)
.


Figura 5 – A tensão V32’(gap) é igual ao somatório das d.d.p.s induzidas ao longo da espira aberta.

 

Principais pontos de controvérsia

Existência ou não de d.d.p. ao longo do condutor

Deve ser notado que a d.d.p. V(3) – V(2’) é, logicamente, igual a:

 

Em que P1 e P2 são dois nós (ou pontos) intermediários ao longo do condutor. Portanto, a d.d.p. V(3) – V(2’) é igual à soma das d.d.p.s entre os nós intermediários.

Na Figura 5, deve ser notado que a d.d.p. V(3) – V(2’) é igual à soma das d.d.p.s (V(3) – V(0)) + (V(0) – V(2’)), em que o ponto (0) foi escolhido como referência dos potenciais (ver Figura 5). Ou seja, estamos dizendo que o potencial varia ao longo dos condutores longitudinais e que, no caso analisado, não varia ao longo dos condutores transversais da espira sem corrente (ver Figura 2).

Este fato, juntamente com a suposição, muito razoável neste caso, de que a tensão ao longo do condutor aberto da espira é nula, tem gerado uma controvérsia a respeito da existência, ou não, da “d.d.p. ao longo do condutor aberto da espira” [5].

Do ponto de vista experimental, as medições feitas na UVA e no Lactec comprovaram, de maneira insofismável, o fato de que há d.d.p. induzida ao longo de um condutor aberto e que ela pode ser medida. Significando que, em geral, o potencial ao longo do condutor é variável, ainda que não exista corrente circulando por ele.

Modificação introduzida pela existência de malhas de terra no local das medições

A diferença essencial entre as referências 4 e 6 e um ponto de controvérsia na interpretação da referência 3 está na representação da corrente de retorno quando esta circula pela malha de terra. A referência 4 propõe diversas alternativas de distribuição de corrente de retorno na malha, enquanto a referência 6 assume que a corrente de retorno circula praticamente toda ela pelo condutor da malha de terra imediatamente embaixo do indutor.

Na verdade, nenhuma das duas versões é adequada, pois, nos dois testes do Lactec, a corrente de retorno
circulou até a fonte por um condutor de retorno isolado e não circulou pela malha, por razões de segurança. Entretanto, o segundo teste do Lactec comprovou que, mesmo quando a corrente não retorna pela malha, circulam correntes induzidas por ela, as quais modificam as d.d.p.s induzidas ao longo de condutores abertos e também as que surgem no “gap” entre os condutores abertos e entre eles e a malha (ver Anexo 4).

Teste da UVA em abril de 2013

Circuito de medição utilizado no teste da UVA

As medições na UVA foram feitas em abril de 2013 e o circuito de medição utilizado no teste é mostrado na Figura 6, na qual se pode ver que foram efetuados dois tipos de medições:

  • O primeiro tipo foi uma medição da tensão existente entre dois condutores. Foi medida a tensão entre todos os condutores sem corrente e o condutor com corrente denominado “retorno”, e foi medida também, em duas posições ao longo do condutor, a tensão entre o condutor denominado 4, situado na posição central entre os condutores com corrente, e o condutor sem corrente situado mais próximo do retorno, denominado condutor 2’; e
  • O segundo tipo foi uma medição ao longo de um único condutor sem corrente, o condutor denominado 2’.

Valores medidos no teste da UVA

Na Figura 7, são mostrados, em forma de tabela, os resultados das medições feitas na UVA.


Figura 6 – Circuito de medição utilizado no teste da UVA, realizado em abril de 2013.

Análise dos resultados do teste da UVA

O principal resultado das medições efetuadas na UVA foi estabelecer que a tensão medida entre 0’ e 2’ se estabiliza no valor 0,030 para distâncias maiores que 1,5 metros.


Figura 7 – Resultados das medições realizadas no teste da UVA.

Este resultado enfatiza o fato de que, no caso de existir condutores em que a corrente vai e retorna, a densidade de fluxo magnético diminui muito mais rapidamente com a distância aos condutores do que no caso de um condutor com corrente isolado (ver Anexo 4). Isso permite supor que, neste caso, para qualquer laço maior que 1,5 metros, o fluxo magnético enlaçado seria aproximadamente igual ao fluxo magnético enlaçado por um laço infinito. Portanto, a tensão induzida, ao longo do condutor 0 – 2’, é igual à variação no tempo desse fluxo, já que a tensão induzida nos condutores perpendiculares é nula e também é nula a tensão induzida num condutor a uma distância infinita. Desta maneira, a tensão medida de valor 0,030 volts representa uma medição da tensão induzida ao longo do condutor 0 – 2’, mostrando que ela existe e pode sim ser medida.

Foi feita também a observação surpreendente até para os partidários da noção de tensão induzida ao longo de um condutor de que a tensão induzida ao longo do condutor situado na posição central entre os condutores de uma linha de transmissão bifilar é nula, como pode ser visto na Figura 8. Entretanto, este fato é uma decorrência lógica da expressão para a tensão induzida mostrada no Anexo 3.


Figura 8 – D.d.p. nula ao longo do condutor (0”-4) a meio caminho entre o indutor (1)  e  o retorno (2) quando não existe malha de terra no local.

Segundo teste do Lactec em junho de 2014

Este teste foi batizado como segundo teste do Lactec porque existiu uma primeira medição no Lactec, que foi organizada pela ST&SC como parte de um P&D (Pesquisa & Desenvolvimento), elaborado para terceiros.

Essa primeira medição deu origem a um artigo publicado no Power Delivery do IEEE, em novembro de 2009, o qual suscitou uma controvérsia que motivou ao GT-2 (Grupo de Trabalho 2) da ABNT NBR 5419, do Cobei a desenvolver uma pesquisa sobre o assunto.

Como elementos desta pesquisa foram realizados o teste da UVA (Abril 2003) e o teste do Lactec, os quais foram organizados pela ST&SC e patrocinados pela UVA e pelo Lactec, como uma colaboração à pesquisa desenvolvida pelo Cobei.

Circuito de medição utilizado no segundo teste do Lactec

A Figura 9 apresenta o circuito de medição utilizado no segundo teste do Lactec, realizado em junho de 2014.O circuito de medição utiliza uma armação de tubos de PVC, mostrada na Figura 10. Os induzidos abertos 2’, 5, 4, 6, 7 mostrados na Figura 9 foram instalados dentro de tubos de PVC para garantir sua posição ao longo dos quatro metros de extensão.


Figura 9 – Circuito de medição utilizado no segundo teste do Lactec, realizado em junho de 2014.

A Figura 11 é uma vista superior do circuito de teste, que mostra como se formam as “áreas de sombra” magnética nas imediações do circuito.  A mesa de medição na qual fica o voltímetro e o osciloscópio é colocada nessa área para minimizar o acoplamento magnético com o indutor e com o retorno.

Como o acoplamento magnético na área de sombra é muito reduzido, verificou-se, durante as medições, não ser necessário retorcer a parte final dos fios do “loop” de medição do voltímetro.


Figura 10 – Estrutura de suporte do circuito de PVC utilizado no segundo teste do Lactec.


Figura 11 – “Loop” de medição do voltímetro e das “áreas de sombra” magnética. Medição da d.d.p. (Va0”) ao longo do trecho (a-0’’). Vista em planta do teste do Lactec realizado em junho de 2014.

A diferença fundamental entre o teste da UVA e o segundo teste do Lactec reside na existência no segundo

caso de estruturas metálicas nas quais poderiam ser induzidas correntes que alterassem o campo magnético produzido. No caso da UVA, não existia malha de terra no local do ensaio; já no caso do Lactec, o circuito de ensaio foi colocado diretamente sobre a malha de terra do hall de alta tensão.

Além disso, no teste da UVA, a extensão do indutor e do retorno era de apenas 2 m, com 1 m de separação entre eles, e a corrente de teste era de 50 A; já no segundo teste do Lactec, ainda que a separação entre o condutor de ida e o de retorno da corrente era também de 1 m, o comprimento desses condutores era de 4 m e a corrente de ensaio de 150 A. A armação de PVC do circuito de medição da UVA era também um pouco menos elaborada.

Assim sendo, o segundo teste do Lactec serviria para confirmar ou não as constatações feitas no teste da UVA, referentes à tensão induzida ao longo de um condutor, bem como para determinar o efeito da malha do laboratório, e assim determinar o tipo da modificação introduzida pela presença de condutores extensos (não similares a um fio) na vizinhança de uma linha de transmissão.

Para este efeito, no segundo teste do Lactec foram também efetuados dois tipos de medições:

  • O primeiro tipo foi uma medição da tensão existente entre dois condutores. Foi medida a tensão entre todos os condutores sem corrente e o condutor com corrente denominado “retorno”, e também foi medida a tensão entre condutores sem corrente; e,
  • O segundo tipo foi uma medição ao longo de um único condutor sem corrente, o condutor denominado 2’.

Valores medidos no segundo teste do Lactec

Na Tabela 1 do relatório Institutos Lactec LAT 2590/2014 [9], reproduzida a seguir, pode-se ver o conjunto dos valores medidos com o circuito de medição mostrado na Figura 9.

Deve-se notar que o ponto chamado 0’’ na Figura 9 é chamado de “a” na Tabela 1  seguir. Estes valores incluem a medição ao longo do condutor 2’, para dois pontos ao longo dele; e também a medição da tensão entre os cinco induzidos utilizados no teste do Lactec e condutor de retorno.

Tabela 1 – Valores medidos no segundo teste do Lactec com o circuito de medição da Figura 9

Na Tabela 2 do relatório do Lactec LAT 2590/2014 [9], reproduzida a seguir, pode-se ver o conjunto dos valores medidos com o circuito de medição mostrado na Figura 9, porém com o ponto 0’’ (a) aterrado na malha de terra do laboratório.

Estes valores incluem a medição da tensão entre os cinco induzidos utilizados no teste do Lactec e o condutor de retorno e a malha de terra do laboratório, para dois pontos ao longo dele; e também, a medição da tensão entre os cinco induzidos utilizados.

Análise dos resultados do segundo teste do Lactec

Os dados medidos no segundo teste do Lactec, apresentados na Tabela 1, confirmam que os valores de d.d.p. medidos ao longo do condutor aberto (a-2’) permanecem em um valor na faixa de (155,0 V e 157,4V) para distâncias (D) maiores que 1,0 metro.

Os dados mostram também que, para o trecho (a-b), que tem a metade da extensão de (a-2’) a d.d.p. permanece em um valor próximo de 78 V (cerca de metade dos valores medidos para (a-2’)), também para distâncias (D) maiores que 1,0 metro.

Observou-se, durante os testes, que esta distância (D) de estabilização é um pouco menor que no caso do teste da UVA. Essa redução é atribuída à existência, neste caso, de outras correntes induzidas na malha de terra.

Conforme já mencionado, no teste da UVA constatou-se que a d.d.p. induzida ao longo de um condutor aberto equidistante do indutor e do retorno era nula.

Tabela 2 – Valores medidos no segundo teste de Lactec com o circuito de medição da Figura 9, com o ponto 0’’ (a) aterrado na malha de terra do laboratório

Entretanto, no teste do Lactec, foi constatado que a d.d.p. nula ocorre para um condutor aberto situado um pouco mais perto do retorno, devido ao efeito dos acréscimos de tensão induzida nos condutores abertos, causados pelas correntes induzidas que circulam na malha (ver Figuras 13, 14, 15, 16 e 17).

Com referência às medições de d.d.p. entre condutores, mostradas na Tabela 2, as medições no Lactec mostraram valores crescentes com a distância de separação com o condutor de retorno; fato que está em perfeita concordância com o conhecimento comum de que o campo magnético produzido pelo condutor de retorno é, na região entre os condutores, do mesmo sentido que o campo magnético produzido pelo condutor de ida da corrente.

A Tabela 3 a seguir mostra o cálculo da tensão induzida ao longo dos cinco induzidos abertos considerados no segundo teste do Lactec supondo, inicialmente, que não há malha de terra no local. A tabela utiliza a mesma fórmula aproximada mostrada na Figura 3 e analisada no Anexo 3. As dimensões (A), (B) e (C) correspondem ao circuito de teste mostrado na Figura 9.

Utilizando uma modelagem aproximada das correntes induzidas, mostrada no Anexo 4, consegue-se calcular com boa aproximação os acréscimos de tensão induzida nos condutores abertos, aplicadas pelas correntes induzidas na malha, e chegar aos valores de d.d.p. induzida medidos no segundo teste do Lactec, como pode ser visto na Tabela 4 a seguir.

Tabela 3 – Cálculo da tensão induzida ao longo dos cinco induzidos abertos do segundo teste do Lactec, supondo que não existe malha de terra no local

Deve ser observado que o valor calculado, mostrado na última coluna da Tabela 4, está dentro da faixa de valores de d.d.p. medida, levando-se em conta o off-set do voltímetro de medição (ver Tabela 2).

Tabela 4 – Tabela de cálculo da tensão induzida ao longo dos condutores abertos, no segundo teste do Lactec (cálculo dos acréscimos é mostrado no Anexo 4)

(*) Deve ser observado que o sinal indicado nas colunas 2 e 3 da Tabela 4, que correspondem à faixa dos valores medidos, foi determinado com base no sinal da última coluna da Tabela 4, pois os dados das medições, mostrados na Tabela 2, indicam apenas o módulo da d.d.p. (na coluna 4) e o off-set do voltímetro
(na coluna 3).

Conclusões

O presente artigo está baseado nas duas clássicas formulações básicas do eletromagnetismo: a formulação do eletromagnetismo em termos da intensidade do campo elétrico (E) e da densidade de fluxo magnético (B), e a formulação em termos do potencial elétrico (V) e do potencial magnético (A); assim como nas suas respectivas simplificações: a teoria das linhas de transmissão e a teoria de circuitos.

Nossa primeira conclusão é que, para sistemas eletromagnéticos que cumpram todas as restrições necessárias, como é o caso de linhas curtas operando em frequências baixas, todas as descrições acima são igualmente válidas e as metodologias de cálculo nelas baseadas, se corretamente aplicadas, devem conduzir aos mesmos resultados.

Como a controvérsia que deu origem às três publicações na Eletroevolução [4,5,6] se refere a interpretações “práticas” destes enfoques, este artigo utiliza medições de laboratório para dirimir essas controvérsias, duas feitas no Laboratório de Alta Tensão do Lactec, em Curitiba, e outra no Laboratório de Engenharia Elétrica da Universidade Veiga de Almeida (UVA), no Rio de Janeiro. Sendo a apreciação dos autores deste artigo que os principais pontos de controvérsia são:

  • Existência ou não de d.d.p. ao longo de um condutor sem corrente;
  • Influência da presença de malhas de terra no local do teste.

As principais conclusões são as seguintes:

a) Existe diferença de potencial (d.d.p) induzida ao longo de um condutor, sem circulação de corrente, e ela pode ser medida;

b) A d.d.p. induzida por um indutor e seu retorno, ao longo de um trecho de condutor sem corrente, pode ser calculada, com boa aproximação, por meio da fórmula simples, mostrada na Figura 3 e analisada no Anexo 3;

 

c) A d.d.p. induzida por um indutor e seu retorno, ao longo de um trecho de condutor sem corrente, pode ser medida, com boa aproximação, por meio de um voltímetro colocado num laço formado pelo trecho condutor em questão, por dois condutores perpendiculares à circulação de corrente e por um condutor colocado paralelo à circulação de corrente, a uma distância suficientemente grande da linha de transmissão, de modo que o laço assim formado enlace praticamente todo o campo magnético produzido pela linha (ver Figura 11). Esta distância, no caso dos testes da UVA e do Lactec (ver Figuras 6 e 9) era de cerca de 1 m, da mesma ordem de grandeza que a distância entre o indutor e o retorno;

d) Na situação em que a linha de transmissão bifilar (um indutor e seu retorno) está longe de estruturas metálicas ou da terra, dizer que o condutor sem corrente está aterrado apenas em uma extremidade equivale a dizer que o ponto de aterramento é escolhido como potencial zero, ou referência dos potenciais;

e) O cálculo da d.d.p. induzida por um condutor indutor e por seu condutor de retorno à fonte, sobre condutores abertos, em local no qual exista malha de terra, deve levar em conta os acréscimos na d.d.p. induzida ao longo dos condutores abertos produzidos pelas correntes induzidas que circulam na malha de terra;

f) Quando se calcula a d.d.p induzida no “gap” que se forma entre o terminal aberto de um condutor e uma malha de terra, estando a outra extremidade do condutor aterrada na malha, não pode ser considerado que o condutor e a malha formam uma espira.  Este engano, muito comum, pode dar origem a um valor calculado muito maior que o valor medido.

 

Os anexos, aos quais os autores se referem no decorrer do texto, você acessa clicando aqui.


Agradecimentos

Sergio T. Sobral tem um débito de gratidão com os professores Telmo Noronha e Georges Azzam, da Universidade Veiga de Almeida (UVA), por autorizarem o uso do Laboratório de Engenharia Elétrica para a execução de um dos testes relatados neste artigo.Sobral gostaria de agradecer também ao Sr. Renato Ferreira da Silva, da UVA, e ao Eng. Renato Valk, da Petrobras, pela inestimável ajuda durante os testes da UVA.

Sobral tem também um debito de gratidão com o engenheiro Jobson Modena, coordenador da comissão que analisa aABNT NBR 5419, com o prof. Martin Crnugelj, coordenador do GT-2, pelo apoio e entusiasmo com a execução destes testes. Sobral junta-se a eles para transmitir os agradecimentos do Cobei aos engenheiros Jose Mario Moraes e Silva e Marcio Rot Sans dos Institutos Lactec, que autorizaram a execução dos testes no Laboratório de Alta Tensão, nos dias 2, 3 e 4 de junho de 2014, como uma colaboração ao Cobei, arcando ainda com o custo de materiais e equipamentos utilizados nos testes.

Os autores têm um débito de gratidão com o engenheiro Marcelo Antonio Ravaglio, que coordenou a execução dos dois testes realizados no Lactec mencionados neste artigo. Temos um agradecimento especial ao eng. Victor Simião, que se ocupou de toda a logística do teste, incluindo a aquisição dos fios e suportes e a montagem do circuito de teste de acordo com um projeto preparado pela ST&SC.

Agradecimentos ainda à colaboração financeira dos engenheiros Martin Crnugelj, Paulo F. V. Amaral e Sérgio Cordeiro Sobral, membros do GT-2, que participaram do rateio dos custos de viagem e estada durante o teste. Sobral tem um agradecimento especial ao eng. Saulo José Nascimento Cisneiros, vice-presidente do Cigré Brasil, pelo estímulo ao longo de toda esta pesquisa e pela acolhida nas páginas da Revista Eletroevolução.

S. Sobral, P. Munhoz e o Prof. Martin Crnugelj têm uma dívida de gratidão com o saudoso engenheiro Armando Pereira dos Reis Miranda, falecido em 2014, que, durante os últimos 30 anos, empenhou-se para que se fizesse uma pesquisa mais profunda sobre conceitos relativos a tensões induzidas.


Referências

[1] JACKSON, J. D. Classical electrodynamics. New York: John Wiley & Sons, 1962.

[2] STEINMETZ, C. P. Theory and calculation of alternating current phenomena. 3. ed. Electrical World and Engineer Inc., New York, 1900.

[3] SOBRAL, S. T. et al. Rigueira, IEEE Transactions on Power Delivery, v. 24, n. 4, Oct.  2009, p. 1.876-1.882.

[4] José Claudio de Oliveira e Silva, ELETROEVOLUÇÃO, No. 74, pp.35-53, Março 2014.

[5] OLIVEIRA E SILVA, A. ELETROEVOLUÇÃO, n. 75, p. 25-36, junho 2014.

[6] SOBRAL, S. T.; SOBRAL, S. G.; AMON FILHO, J. Eletroevolução, n. 74, p.25-34, março 2014.

[7] CIGRE WG C4.208, CIGRE TB 535 – EMC within Power Plants and Substations, 2013. Atualiza a CIGRE TB 1

24 – EMC within Power Plants and Substations, 1997.

[8] STEVENSON JR., William D. Elements of power system analysis. International Student Edition – Second Edition.

[9] Relatório Institutos Lactec LAT 2590/2014. 


*Sérgio Toledo Sobral é engenheiro eletricista. Foi consultor especial no Projeto Itaipu. Desde 1990, atua como consultor em sua própria companhia, a ST&SC Serviços Técnicos Ltda., especializada em estudos e projetos de aterramento e controle de interferências eletromagnéticas.

Patrício Munhoz Rojas é engenheiro eletricista. Atuou como pesquisador e professor na Universidade de Chile e como pesquisador na Copel. Desde 1999, é pesquisador do Lactec, onde tem trabalhado nas áreas de medição em alta tensão, compatibilidade eletromagnética e proteção contra descargas atmosféricas.

 


 

 

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