Edição 122 – Março de 2016
Por Michel Epelbaum
Passando pelo equinócio de outono em 20 de março, quando o dia e a noite têm igual duração, passamos por momentos “quentes” na sustentabilidade e na sociedade que tenho de relatar e desabafar:
1) Fogo
O último mês de fevereiro foi o mais quente já registrado (desde 1880), segundo a NASA. Esse foi o quinto mês seguido em que a temperatura da superfície terrestre superou a média do século 20 em mais de um grau. O ano de 2015 já havia sido o mais quente desde 1880, com uma temperatura 0,90 ºC acima desta média. O recorde anterior era de 2014 (0,74ºC) e, agora, 2016 caminha a passos largos para superar a marca do ano passado.
No plano político, vivemos um mês de março flamejante, com uma sucessão espantosa dos fatos e dados relativos à Operação Lava-jato, novas denúncias e delações premiadas, processo de “impeachment” do presidente da república e a iminente decisão (processo judicial x ministério) do eminente símbolo maior do partido governista. Manobras, conversas e intenções ocultas de protagonistas dos últimos 14 anos do cenário político foram arrancadas das sombras da noite para exposição à ainda abundante luz do dia. As vísceras do poder estão expostas, sangrando. As comparações remetem a filmes sobre doenças terminais e suspense policial, com representações dramáticas dignas de um Oscar.
Sobre o Oscar, e voltando ao planeta, vale mencionar o discurso do ganhador do prêmio de melhor ator, Leonardo DiCaprio, comentando sobre o ano mais quente da história, e que tiveram de ir ao extremo sul para encontrar cenários com neve para a filmagem.
2) Derretimento
Vários dados evidenciam a mudança climática pela qual passa o planeta. Cito o do Centro Nacional de Dados sobre Neve e Gelo dos Estados Unidos, segundo o qual, em fevereiro passado, o gelo marinho no Ártico se estendia por 14,22 milhões de km², o menor valor já registrado para o mês.
Enquanto isto, no Congresso Nacional, a base governista está derretendo. O barco está afundando e diariamente são vistas disputas pelos botes salva-vidas, personagens se atirando ao mar, muitos avaliando o momento certo para “se dar bem” ou para que lado ir. Notadamente, o maior partido brasileiro, que um dia foi a herança do movimento democrático, hoje mais próximo de uma sanguessuga vampira, procurando suas próximas vítimas, assim como o Aedes Aegypt, carregando em seu corpo o vírus da zika e outras doenças.
3) Seca e sombra
No dia 22 deste mês excepcional comemorou-se o dia mundial da água. E o El Niño acabou ajudando as autoridades públicas e a sociedade: as chuvas aumentaram no verão! Alckmin decretou no início de março o fim da crise hídrica em São Paulo, considerando o índice atingido de quase 60% do Sistema Cantareira (quase 30% reais, descontando as duas cotas de volume morto adicionadas recentemente) e quase 40% do Sistema Alto Tietê. Apesar de a situação estar mais confortável do que no ano passado, o consumo aumentou nos últimos meses, estamos longe da normalidade, e há ainda muito a fazer. E agora entramos no período seco.
Neste mês de março, finalmente, foi anunciado o PIB de 2015: um tombaço de 3,8%! O maior desde o governo Collor. O 30º colocado dentre os 32 países que já anunciaram o resultado de 2015. O PIB per capita teve queda ainda maior (4,6%). A indústria perdeu 6,2% (dentro dela, a indústria de transformação foi ainda pior, desabando 9,7%). E a previsão para 2016 é de queda similar, que seria a maior da história do Brasil em dois anos seguidos, resultado das quedas do consumo das famílias e dos investimentos, cenário político e Lava-jato, alta de inflação e juros, baixa nos preços de commodities. No setor elétrico, diversos ativos estão à venda e as perspectivas são sombrias para este ano.
A outra face da moeda: as chuvas maiores do verão e a crise econômica (fatores não intencionais da gestão federal) ajudaram a conter a crise de energia e a sair da bandeira tarifária vermelha. O consumo de energia elétrica caiu 2,1% em 2015 (fonte: EPE). A maior queda veio da indústria (5,3%), mas também houve recuo residencial (0,75%, o maior desde 2004). Quando computado o consumo médio por residência, a queda foi ainda maior (3%, a maior desde 2002). Mas ainda a verificar os efeitos da estação seca e das “sombras” econômicas.
Desculpem o tom da coluna acima do normal, mas este mês de março foi extremo. Espero que as águas de março fechando o verão sejam promessa de vida nos nossos corações!