Testes de fábrica com o emprego de novos materiais, considerando dimensões e peso que não demandam licença especial para tráfego.
O transformador de potência é um dos equipamentos mais importantes do sistema de distribuição, sendo responsável por transferir energia elétrica ou potência elétrica de um circuito a outro, transformando tensões e correntes de um circuito elétrico.
Em muitas situações, resultantes de contingências ou aumento de demanda por períodos pré-determinados, as redes de transmissão e distribuição estão limitadas quanto à realização de operações ou manobras, por estarem operando próximas ao limite de carregamento; ou não terem condições de realizar obras de expansão, em função da relação entre a necessidade e o tempo de obra. Nesses casos, são utilizados transformadores ou subestações móveis que possibilitam a minimização dos transtornos e corte de cargas, decorrentes das condições impostas anteriormente.
Um grande problema é que, em muitos casos, quando da necessidade de transportar os transformadores ou subestações móveis em vias de transporte normais, há a necessidade de definir esquemas de transporte e esquemas especiais de acompanhamento de tráfego, podendo retardar o atendimento previsto.
Nessas situações, unidades móveis compactas construídas a partir do emprego de novos materiais isolantes, que tenham um limite de operação maior a altas temperaturas, atenderiam as necessidades impostas. Assim, foi proposta a construção de um transformador móvel de alta densidade de potência com base nas recomendações dadas em Std
1276-1997 (IEEE, 1997).
Ademais, no Brasil, existem valores limites para o peso e dimensões físicas que devem ser cumpridas a fim de evitar a necessidade de licença especial de trânsito. Para a configuração do transformador móvel proposto, os limites são: peso total (incluindo caminhões e semi-reboque) igual a 53,0 t, comprimento máximo igual a 18,6 m, largura máxima de 2,6 m e altura máxima igual a 4,4m, como representado na Figura 1.
A ideia por trás deste projeto foi obter o máximo possível de potência mantendo as dimensões e o peso a um nível que não requer licença especial para se mover nas estradas. Neste sentido, o presente trabalho apresenta as características do transformador móvel com alta densidade de potência, bem como os resultados obtidos a partir de teste de fábrica.
Desenvolvimento
Variáveis do projeto e racionalização do processo construtivo
A) Resultados do projeto
O projeto inicial previa uma potência de 20-25 MVA. Porém, com o desenvolvimento da pesquisa e a exploração das características térmicas dos novos materiais, verificou-se que a potência poderia alcançar o valor de 30-40 MVA.
Nesse sentido, um projeto com os pesos dos enrolamentos e do núcleo inferiores ao conceito inicial proposto foi desenvolvido. Os pesos atuais obtidos são apresentados na Tabela 1.
Os materiais isolantes inicialmente previstos para 20-25 MVA eram compostos de papel Kraft e Nomex em uma isolação híbrida. Nessa condição, somente nos pontos críticos seriam utilizados o Nomex, visto que tem custo muito superior em relação ao papel Kraft.
Para atingir os novos valores de potência (30-40 MVA), o ambiente interno ao tanque do transformador atingiria elevadas temperaturas que o papel Kraft não suportaria. Dessa forma, optou-se por utilizar a isolação sólida desenvolvida 100% em Nomex, inclusive nas capas isolantes. Tal isolação, associada ao emprego de óleo vegetal suportaria a condição de elevadas temperaturas.
Ademais, para obter uma potência entre os valores de 30 MVA e 40 MVA e atender aos limites de pesos e dimensões desejadas para tráfego sem licença especial, foi necessário o aumento de temperatura de trabalho dos enrolamentos e dos materiais isolantes. Para tanto, foi proposto um sistema complementar de resfriamento composto por três módulos. São eles: conjunto de trocadores de calor aletados com ar forçado em série, sistema de nebulização e um trocador de calor a placas com resfriamento com água gelada produzida em Chiller.
B) Características finais de projeto
O desenho do transformador considerando as suas dimensões é apresentado na Figura 2. A Figura 3 ilustra o pré-projeto do caminhão de transporte, considerando o transformador móvel. A Tabela 2 apresenta a tensão nominal especificada para o projeto transformador.
Sistema de monitoramento
O sistema de monitoramento é composto por sensores de temperatura via fibras óticas instaladas no transformador, um Dispositivo Eletrônico Inteligente (Intelligent Electronic Device – IED) e um sistema de comunicação GPRS que realizará a comunicação com o centro de controle. Sensores de temperatura PT100 também foram instalados no topo do óleo e na entrada e saída do óleo para o sistema de troca de calor.
Os dados aquisitados são enviados via sistema de comunicação GPRS à sala de controle pré-definida, permitindo a gestão otimizada do despacho e operação do transformador. Dessa forma, a partir das informações coletadas, será possível realizar consultas voltadas à operação e manutenção preventiva do equipamento monitorado.
O sistema de monitoramento proposto deu suporte aos testes de fábrica realizados junto ao transformador.
Resultados dos testes de fábrica
Os testes de fábrica foram realizados inicialmente para uma potência de 32 MVA. Porém, para essa potência, o transformador resultou em uma elevação de temperatura maior que a especificada em projeto. Por conseguinte, de forma a adequar ao valor especificado de elevação, foi feita a correção da potência para o valor de 30 MVA, definindo, assim, a potência máxima de operação do transformador. A seguir são apresentados os resultados dos testes de fábrica:
- Perdas em vazio;
-
Perda de potência nominal (tensão mínima do enrolamento de alta tensão);
-
Impedância de curto-circuito;
-
Aumento da temperatura (em condição nominal);
-
Resistência média dos enrolamentos.
a) Resistência dos enrolamentos
As resistências foram medidas em vazio a uma temperatura de 26 °C. A Tabela 3 apresenta os valores de resistências medidos.
b) Perdas em vazio
As perdas em vazio obtidas nos testes de fábrica foram de 10,4 kW. As perdas no cobre a uma temperatura de 150 °C foram de 933 kW (para o pior tap) e as perdas totais obtidas foram de 944 kW.
c) Impedância de curto-circuito
A impedância de curto-circuito obtida durante os testes de fábrica foram de 111 ohm a 176 ohm, dependendo da posição do tap do transformador.
d) Aumento de temperatura em potência nominal
O teste de aumento de temperatura foi feito para o tap de tensão mínima do enrolamento de alta tensão (117kV) e potência igual a 32 MW, resultando em uma corrente igual a 158,9 A. O aumento da temperatura do topo do óleo e da temperatura absoluta são apresentados na Figura 5.
e) Medição da temperatura do ponto mais quente
A curva de resfriamento do enrolamento (após a temperatura nominal ser atingida) é apresentada na Figura 6.
O valor de resistência média obtido para o enrolamento de baixa foi igual a 0,290 ohm e para o enrolamento de alta foi igual a 0,6 ohm. A constante de tempo de temperatura do enrolamento (ponto mais quente) resultou em aproximadamente 2,5 min. Este valor foi obtido para medidas de temperatura no ponto mais quente iguais a 120°C (enrolamento de alta) e 165°C (enrolamento de baixa) em potência nominal.
f) Cálculo da temperatura do ponto mais quente a partir do carregamento do transformador
A Equação (1) permite o cálculo da temperatura do ponto mais quente a partir do carregamento do transformador (IEC, 2004).
Em que:
qh é a temperatura do ponto mais quente;
qa é a temperatura ambiente;
Dqor é a elevação do topo do óleo em potência nominal (= 78 °C);
R é a relação entre as perdas sob carga e em vazio (= 89,7);
Hgré o gradiente entre o topo do óleo e o ponto quente para potência nominal (= 41,6 °C);
x,y são constantes a serem determinadas em ensaio (para o presente transformador foram considerados x = 0,9 e y = 1,6);
K é o valor da potência dividido pelo valor da potência nominal.
A Figura 7 ilustra o transformador móvel durante os testes de fábrica.
Nesse ponto, vale destacar que para operação com potência superior a 30 MVA, considerando o intervalo de 30 MVA a 40 MVA, foi considerado o emprego do sistema de resfriamento complementar. Nesse caso, em ensaios de operação, o transformador após recebido o resfriamento complementar do óleo vegetal, teve sua capacidade de operação aumentada para o valor de 39,5 MVA, com propensão a alcançar maiores patamares de potência, mantendo as condições de operação do óleo dentro dos limites adequados de elevação de temperatura.
Conclusões
O emprego de transformadores móveis minimiza alguns inconvenientes, bem como evita o corte de cargas, proporcionando o fornecimento contínuo de energia ao sistema. Consequentemente, o emprego de transformadores móveis ajuda a manter bons índices de energia, mitigando alguns dos riscos regulatórios. Quando necessário, transportar transformadores de grande porte é caro, e esquemas de transporte especiais (rotas especiais, batedores, etc.) retarda o atendimento ao consumidor.
Neste projeto específico, o desafio proposto foi o de construir um transformador móvel com alta densidade de potência, com carregamento flexível e transporte de logística simples, satisfazendo as necessidades da rede elétrica. Para fazer isso, novos conceitos, processo de construção e os materiais tiveram de ser considerados. Para tanto, foi necessário desenvolver um projeto específico de maneira a racionalizar as variáveis de projeto e processo construtivo.
As principais dificuldades encontradas estão relacionadas ao sistema de transporte, resultado dos limites de peso e dimensão impostos ao projeto, à utilização da isolação sólida 100% em Nomex, uma vez que até os dias de hoje não se construiu capas do transformador em Nomex; e ao dimensionamento dos trocadores de calor, uma vez que é objetivo do projeto dissipar as perdas, com a maior eficiência e com o menor nível de ruído possível.
Adicionalmente, verificou-se que o emprego do resfriamento complementar do óleo vegetal permitiu um aumento da potência de até 32% (em relação ao valor de 30 MVA), com propensão a alcançar maiores patamares de potência devido à maior capacidade existente da unidade de resfriamento. Estes resultados mostram-se promissores no que diz respeito à compactação de transformadores móveis de alta tensão.
Por fim, os resultados apresentados pelos testes de fábrica mostraram-se satisfatórios, validando os objetivos propostos no que tange ao desenvolvimento de um transformador móvel com alta densidade de potência para tráfego sem licença especial.
Referências
- Oliveira, C. C. M.; Brittes, J. L. P.; Junior, V. S.. Avaliação do Resfriamento complementar de óleo vegetal de transformador móvel de alta potência. Submetido ao XXII SENDI, Curitiba, 2016. DuPont. “Nomex Tipo 410”. Disponível em: http://www2.dupont.com/Energy_Solutions/en_US/assets/downloads/Nomex%20Paper%20410/DPP_Nomex410_K20612-1.pdf. Acesso em: 25/04/2016.
- Hamoud, G.A. “Use of mobile unit transformers in high voltage load stations”, In: 2008 Power and Energy Society General Meeting – Conversion and Delivery of Electrical Energy in the 21st Century, Pittsburgh, PA, 20-24 July 2008. pp. 1-8.
- IEEE, “Std 1276-1997: IEEE Guide for the Application of High-Temperature Insulation Materials in Liquid-Immersed Power Transformers”, 1997.
- International Electrotechnical Commission. “Power Transformers – Part 14: Design and application of liquid-immersed Power transformers using high-temperature insulation materials”, 2004, Switzerland.
- Sousa, T.; Jardini, J. A.; Bini, M. A.; Carneiro, J. C.; Uemura, F.; Brittes, J. L. P.. “Characteristics of High Power Density Transformer without a Special License to Traffic” IEEE T&D Latin America 2014, Medellin, 2014.