Um novo papel para as hidrelétricas no Brasil

A expansão do parque gerador de energia elétrica segue impulsionada pela disseminação em larga escala de projetos de usinas eólicas e fotovoltaicas, embalada pelo apelo incontestável da transição energética e por vantagens comparativas em relação a outras fontes. A pujança do crescimento da geração de eletricidade a partir da energia do sol e da força dos ventos contrasta, entretanto, com um quadro de quase estagnação da geração hidrelétrica. Esse contraste nos leva a questionar: qual é o futuro da geração hidráulica no país?

Os dados do crescimento da matriz elétrica em 2023, produzidos pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), evidenciam a paralisia da geração hidráulica, que por muitas décadas conduziu, com grandes empreendimentos, o crescimento do parque gerador elétrico. Em 2023, entraram em operação apenas 158 megawatts (MW) em pequenas centrais hidrelétricas (PCHs) – usinas com 5 a 50 MW de potência – e outros 11,4 MW em centrais geradoras hidrelétricas (CGHs), que são as usinas com capacidade com até 5 MW. Não foi registrada a entrada em operação de nenhuma usina hidrelétrica – as centrais com mais de 50 MW de capacidade instalada.

Apesar dessa situação, as usinas hidrelétricas, que contam com uma participação majoritária na matriz elétrica – respondem por 54,5% da capacidade total do parque gerador do país -, podem desempenhar um papel importante na nova configuração da operação do sistema elétrico, determinada pela disseminação de fontes com geração intermitente. Explica-se: dependentes da presença do sol e da força dos ventos, as fontes fotovoltaica e eólica não sustentam a produção de energia o tempo todo. Para garantir a segurança do suprimento, diante das oscilações na produção de eletricidade dessas fontes, é necessário que a matriz elétrica disponha de alternativas que proporcionem energia firme, como é o caso das usinas hidrelétricas e das termelétricas. A vantagem das usinas hidrelétricas é que, assim como as usinas fotovoltaicas, a geração hidráulica é uma fonte renovável, o que contribui para a transição energética.

Portanto, há uma forte corrente do setor elétrico que defende a utilização das hidrelétricas como se fossem “baterias naturais” do sistema elétrico. Ou seja, as hidrelétricas deixariam futuramente de atuar “na base”, no jargão dos técnicos do setor – ou seja, funcionando em tempo integral para atender à demanda imediata do sistema elétrico, papel que caberia às fontes intermitentes. E passariam a atuar como garantia de fornecimento, considerando as oscilações da oferta por conta da intermitência dessas fontes. Já há um movimento para, inclusive, prover a necessária regulação dessa nova atividade.

Atento a esse importante novo papel das hidrelétricas, o CIGRE-Brasil, um think tank que atua na busca de soluções para a modernização do setor elétrico brasileiro, tem-se dedicado a estudos que contribuam para maximizar a utilização da geração hidráulica para tornar mais segura a operação do sistema elétrico. Um trabalho em particular, intitulado “Estado da arte e tendências das tecnologias de turbinas Francis com ampla faixa operativa”, produzido por um fabricante de turbinas no âmbito do Grupo de Estudos de Geração Hidráulica (GGH), que atua no SNPTEE – Seminário Nacional de Produção e Transmissão de Energia Elétrica, evento do CIGRE-Brasil, aponta um potencial para a ampliação da capacidade de regulação de carga no sistema elétrico, levando-se em conta, justamente, o aumento significativo na participação de fontes renováveis intermitentes na geração de energia, embora esta ampliação da faixa operativa de turbinas Francis necessite um amplo estudo de modificação na sua fabricação, além, naturalmente, da elevação dos custos e da longa duração na modernização destas inúmeras turbinas, que já estão em operação em todo o país.

O estudo está centrado na possibilidade de maior aproveitamento das turbinas Francis, uma das mais utilizadas na geração hidrelétrica no país.  São mais de 400 turbinas espalhadas pelo Brasil, que respondem por aproximadamente 75% da capacidade de geração hidrelétrica. Essa turbina é conhecida pela sua flexibilidade e pela capacidade de operar em faixas de quedas e com potências nominais diferenciadas. Mas funcionam atualmente dentro de uma faixa operacional limitada entre 50% e 100% de sua potência nominal, prática que restringe sua flexibilidade em resposta a variações na demanda e disponibilidade dos recursos hídricos.

De acordo com o estudo, a modernização das usinas hidrelétricas existentes no Brasil com turbinas de ampla faixa operacional proporcionaria uma melhor resposta às variações resultantes da participação crescente das fontes intermitentes. Dessa forma, assegurariam uma melhor integração dessas fontes ao sistema elétrico nacional, assegurando estabilidade e confiabilidade no fornecimento de energia. Para o país, o resultado seria contribuir para impulsionar ainda mais a transição energética do país.

Autores

João Carlos de Oliveira Mello (presidente), 

Antonio Carlos Barbosa Martins (diretor técnico), 

Maria Alzira Noli Silveira (diretora de assuntos corporativos) e 

André Luiz Mustafá (diretor financeiro)

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