Utilização de painéis fotovoltaicos para abastecer tomadas de carros elétricos e comparativo de custos entre carros elétricos e à combustão

Por: Cristian Adolfo Alvez - Lauriana Goulart Estevão - Renan Souza Moura

Resumo

A tecnologia dos carros elétricos está atualmente em auge, incentivada principalmente por políticas ambientais. No entanto, a utilização desta tecnologia se apresenta como um desafio para muitos potenciais usuários, devido à falta de conhecimento dos custos envolvidos. Dentro deste contexto, este trabalho apresenta uma análise de viabilidade econômica do uso de carros elétricos.

De forma mais específica, foram simulados e avaliados diversos cenários, como a sensibilidade de potência energética entre painéis fotovoltaicos e a tomada para abastecimento de carros elétricos e os custos dos carros elétricos perante os de combustão. Os resultados mostram que o uso do carro elétrico se mostra atrativo em termos de custos de operação, além de estimular os consumidores a utilizar tecnologias de transporte que podem ser abastecidas por recursos renováveis.

1- Introdução

Caso um consumidor queira atenuar aumentos sucessivos na sua fatura de energia elétrica, os sistemas fotovoltaicos conectados à rede se apresentam como ótimas soluções técnicas, podendo resultar em economias de até 90% (SOLAR, 2022). Tais sistemas são constituídos basicamente pelos painéis fotovoltaicos, inversores, medidor bidirecional e os equipamentos de proteção e aterramento. A energia gerada pelos painéis fotovoltaicos é enviada para a rede da concessionária, a qual resulta em créditos que podem ser utilizados em até 60 meses (ANEEL, 2021).

Quando uma nova carga elétrica é inserida em um cenário que já existe um sistema fotovoltaico funcionando, é essencial avaliar se haverá necessidade de ampliação desse sistema para atender a nova demanda energética. Dentro deste contexto, como a autonomia do carro elétrico é quantificada pela energia armazenada nas suas baterias, pode-se usar painéis fotovoltaicos para abastecer tomadas de carros elétricos.

Diversos trabalhos na Literatura Técnica abordam estas duas tecnologias. Em (LOBATO et al, 2018), uma estação de carregamento de veículos elétricos baseado em placas fotovoltaicas é desenvolvida em um ambiente laboratorial universitário. Os autores de (LONGO, 2021) examinaram a integração de diversas fontes de energias renováveis e o uso de carro elétricos em todas as regiões da Itália, tendo como objetivo a redução da poluição.

O uso de painéis fotovoltaicos instalados no teto de veículos elétricos é demonstrado em (SCHUSS, 2021). Uma técnica de minimização do custo de eletricidade diária de um parque industrial é apresentada em (ZHIYONG, 2020), o qual propõe uma estratégia de agendamento de carregamento de energia de veículos elétricos abastecidos por sistemas fotovoltaicos. Considerando que uma das desvantagens do uso da energia fotovoltaica é a sua intermitência de geração, o uso conjunto com baterias permitiu em (HALIMA, 2022), o carregamento de veículos elétricos em qualquer instante.

A utilização conjunta de carros elétricos e sistemas fotovoltaicos também tem sido discutida na Literatura técnica no que se refere a operacionalidade de sistemas elétricos de potência. Em (MARRA, F. et al, 2013) é proposta uma solução de armazenamento de energia baseada na carga de veículos elétricos para aliviar o aumento de tensão causada no local de instalação de painéis fotovoltaicos. Um método de análise de sensibilidade de tensão em linhas de distribuição de baixa tensão com alta penetração de sistemas fotovoltaicos e carros elétricos é apresentado em (MUCHAO, X. et al., 2022).

Uma melhora na qualidade de energia elétrica é observada em (BHARGAV, 2023), através de um carregador bidirecional de carros elétricos, sendo abastecido por painéis solares. Em (PIRES, 2012), é proposta uma metodologia que permite que um carregador de veículo elétrico baseado em sistemas fotovoltaicos forneça potência reativa para o sistema elétrico.

Um dos objetivos deste artigo é demonstrar o quanto é a variação da viabilidade econômica de sistemas fotovoltaicos na presença de uma tomada de carro elétrico residencial. Esta variação será demonstrada através de projetos fotovoltaicos sem e com a presença da tomada do carro elétrico para um consumidor residencial localizado no centro oeste mineiro.

Outro objetivo é comparar o custo acumulativo do uso de carros elétricos e à combustão. Neste sentido, ferramentas de análise financeira como o Valor Presente Líquido (VPL), o payback e a Taxa Interna de Retorno (TIR) serão utilizadas como figuras de mérito (BLANK, 2007).

Como contribuição técnica, este artigo discutirá ambos os objetivos considerando que todos os parâmetros de análise são referenciados para o ano de 2023, ou seja, pretende-se realizar uma atualização deste tipo de pesquisa, considerando que outras já ocorreram em anos anteriores (SANTOS, 2021) (PEZERICO, 2020) (NASCIMENTO, 2020) (FERREIRA, 2022).

2- Referencial teórico

Esta seção descreverá os conceitos teóricos necessários para o melhor entendimento dos resultados do artigo.

2.1- Diferenças entre carros elétricos e carros à combustão

A primeira grande diferença existente entre estes dois tipos de veículos é em relação a fonte primária utilizada. Um carro elétrico retira energia das suas baterias para se locomover, enquanto que um carro à combustão pode utilizar elementos provenientes do petróleo (gasolina, diesel, gás natural veicular) ou a partir de vegetais ou cereais (álcool). Outro ponto importante é com relação a máxima potência mecânica disponível. Um carro à combustão não entrega toda a sua potência no início de seu funcionamento, algo que já está habilitado no carro elétrico (HUSAIN, 2021).

Quanto a acessibilidade das fontes primárias, o carro à combustão apresenta uma quantidade maior de postos de reabastecimento se comparado como os pontos públicos destinados aos carros elétricos, também classificados como tipo III ou fast chargers (KERSTING, 2022). Até mesmo nos Estados Unidos, país onde a tecnologia de carros elétricos é bem difundida, existem trechos de rodovias com escassez de fast chargers (TESLA, 2023), devendo assim o usuário de carro elétrico ter que recorrer a carregadores residências, tipo I ou II, que usualmente apresentam um tempo de recarga longo.

Neste artigo, a comparação entre carros elétricos e à combustão será entre dois veículos existentes comercialmente, fabricados no ano de 2023 e que apresentam potências próximas. Estes veículos serão citados como X e Y, respectivamente, para os tipos elétrico e à combustão.

2.2- Cálculos de viabilidade financeira

Este artigo pretende demonstrar, utilizando ferramentas de análise de viabilidade financeira, como um dos objetivos, uma análise de sensibilidade da tomada de carro elétrico como carga em um cenário que já existe um painel fotovoltaico funcionando. Para isso, considerou-se a tomada com uma potência igual 7400 W, sendo instalada necessariamente em um potencial de 220 V. Sendo assim, este tipo de abastecimento é caracterizado como nível II e a residência apresenta um consumo mensal médio igual a 650 kWh.

Além disso, pretende-se comparar, como outro objetivo, os custos relacionados ao uso do carro elétrico X e do carro à combustão Y a partir do ano de 2023. Dentro desta análise, assumiram-se os valores iniciais, respectivamente, do kWh e do litro da gasolina iguais à R$ 1,10 e R$ 6,00. Preços de aquisição de cada veículo, a distância média percorrida mensalmente pelos veículos no estado de Minas Gerais (Brasil), valores do IPVA e o custo da instalação da tomada do carro elétrico também compõem os cálculos de viabilidade financeira. A única variável que não será incluída é referente a manutenções dos veículos, devido ao fato que podem existir inúmeros fatores comportamentais e políticas empresariais que afetam este custo.

Assim, três indicadores serão utilizados: Valor Presente Líquido (VPL), Taxa Interna de Retorno (TIR) e Payback. O índice Valor Presente Líquido estima o valor de lucros futuros para o instante de tempo presente. A TIR é calculada considerando que o VPL é nulo e deve ser comparada com a Taxa Mínima de Atratividade (TMA) para que o projeto seja aceito ou rejeitado. O tempo que o investidor precisa para recuperar o capital investido é indicado pelo Payback.

3- Metodologia

A metodologia utilizada neste artigo consiste em cálculos teóricos. Entretanto, é importar enfatizar que o consumidor residencial é real e que já apresenta um sistema fotovoltaico operando. Este consumidor deseja adquirir um carro elétrico e procurou os autores deste artigo para realizar as análises descritas a seguir.

A primeira análise consiste em dimensionar o incremento de potência no sistema fotovoltaico devido à inserção da tomada do carro elétrico, de forma que o sistema fotovoltaico continue a atender toda a demanda energética da residência. Assim, qualquer adição de novos equipamentos no sistema fotovoltaico existente, para a atender a carga do tipo carro elétrico, caracteriza a sensibilidade energética de painéis fotovoltaicos em relação à carga do tipo tomada de carro elétrico.

Para se obter a correspondente sensibilidade das ferramentas de análise financeira devido ao incremento do sistema fotovoltaico, consideraram-se dois cenários hipotéticos:

  1. Cenário 01: Análise de viabilidade econômica do sistema fotovoltaico sem a tomada do carro elétrico na residência analisada, ou seja, um sistema fotovoltaico atendendo o consumo médio de 650 kWh.

  2. Cenário 02: Análise de viabilidade econômica do sistema fotovoltaico com a tomada do carro elétrico na residência analisada, ou seja, um sistema fotovoltaico atendendo o consumo médio de 650 kWh mais a tomada do carro elétrico.

A segunda análise compara os custos acumulados envolvidos na utilização dos veículos elétrico e à combustão a partir do ano de 2023. O preço de aquisição de cada tipo de veículo, o deslocamento médio mensal e o preço do IPVA serão utilizados nos cálculos envolvendo as ferramentas de análise financeira.

4-Resultados

4.1- Análises de sensibilidade devido a inserção da tomada do carro elétrico

Esta etapa consiste em analisar a sensibilidade energética dos painéis fotovoltaicos ao inserir a tomada do carro elétrico, que representa para o sistema um aumento de potência. O sistema fotovoltaico existente, projetado para suprir somente a demanda da residência, é composto por 14 painéis da marca Jinko de 450 kW, que possuem uma geração de 48,62 kWh/mês cada e um inversor da marca Growatt de 6 kW. Após a inserir a tomada do carro elétrico junto a carga da residência, foi necessário redimensionar a usina e os resultados obtidos estão expostos na Tabela 1:

Ao analisar a Tabela 1, pode se constatar que serão acrescentados mais 4 módulos fotovoltaicos, responsáveis por abastecer o gasto energético mensal do carro elétrico que irá consumir aproximadamente 160 kWh. Como o datasheet do inversor apresenta uma potência máxima de operação de 8100 W, não será necessário substituir o inversor.

Portanto, a partir destes resultados foi realizada uma análise de sensibilidade evidenciando o aumento do consumo em 20%, se comparado com o gasto inicial. Além disso, os painéis acrescentados para o abastecimento do veículo apresentam um aumento de 22% da geração projetada para a demanda da residência.

As análises de investimentos para os Cenários 1 e 2 estão indicadas na Tabela 2. Os custos de cada sistema foram baseados no valor do mercado para o ano de 2023, com a Taxa Mínima de Atratividade (TMA) igual a taxa Selic, 13,50%, e o valor da tomada do carro elétrico é considerado apenas no cenário 2.

Por meio da Tabela 2, percebe-se que o incremento de carga do cenário 2 resulta em um aumento de 21,6% no custo do sistema fotovoltaico, uma variação positiva no VPL de 41% e alteração na TIR de 10%. Além disso, tem-se no cenário 2 um payback em menor tempo. Todos estes índices indicam que a inserção da tomada de carro elétrico, para o estudo de caso analisado, melhora a atratividade financeira do sistema fotovoltaico.

4.2- Análises de custos acumulados do uso de carros elétricos e carros à combustão

Com intuito de tornar o estudo mais próximo da realidade foram analisados valores retroativos de cada variável e transformados em taxas fixas, quantificando o aumento do valor monetário para conseguir suprir as despesas dos veículos.

Iniciando pela variável energia, foi consultado o site da Aneel (ANEEL, 2023), que disponibiliza as Resoluções Homologatórias desde o ano de 1998, para então, extrair os valores de aumento anual de energia para o consumidor tipo B1 Residencial, transformá-los em taxas, que resultou em uma média de 6,125% para aplicação anual da tarifa durante 25 anos, período estimado do estudo.

A próxima etapa consiste em analisar o acréscimo do valor da gasolina anualmente. Com este intuito, foi utilizado o site da ANP – Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP, 2023), que forneceu os dados desde o ano de 2004. Sendo assim, foi realizada uma média, que resultou em taxa aplicada anualmente de 3,047% do valor atualizado da gasolina, durante os próximos 25 anos.

Por fim, para a contabilização do IPVA, analisou-se a desvalorização do valor venal do veículo Audi a3 1.6 gasolina, ano 1999, no site da Fipe (FIPE, 2023), tendo como base os dados desde o ano de 2001. A variação dos valores encontrados resultou em uma variação média de desvalorização do veículo de -3,842%. Esta taxa é próxima ao valor da alíquota de 4%, usualmente cobrada no Estado de Minas Gerais anualmente.

Os preços de aquisição, segundo a tabela FIPE, e os respectivos valores iniciais de IPVA de cada veículo, estão indicados na Tabela 3. Em todos os cálculos apresentados nesta seção, a distância média percorrida mensalmente pelos veículos no estado de Minas Gerais é igual a 1075 quilômetros, equivalente a 12900 km por ano, conforme o levantamento baseado em big data, do KBB Brasil (KBB, 2022).

Gráfico 1: Custo anuais de ambos veículos

O gráfico 1 ilustra os custos anuais dos veículos X (elétrico) e Y (combustão) a partir do ano de 2023 até o ano de 2048. É possível observar que os custos anuais envolvendo o uso do carro elétrico é em média 32% menores que o à combustão. Importante enfatizar que esta comparação ilustrada pelo Gráfico 1 considera o custo de aquisição e as despesas anuais (IPVA e combustíveis).

Isso se torna mais evidente no gráfico 2 que demonstra os custos acumulados para o mesmo período de tempo analisado. Entende-se como custos acumulados para o ano Z, aquele que considera a soma de todos os custos anteriores incluindo o do ano Z. Por exemplo, o custo acumulado indicado no Gráfico 2 para o ano 3 é a soma dos custos dos anos 1, 2 e 3. Pelo Gráfico 2, prevê-se uma diferença de R$ 205.972,45 entre os veículos analisados no ano de 2048.

Gráfico 2: Custos acumulados anuais de ambos veículos

5- Considerações finais

Neste trabalho foi apresentada uma análise de viabilidade econômica do uso de carros elétricos. Os resultados mostram que o uso do carro elétrico se mostra atrativo em termos de custos de operação. Com base nos resultados obtidos, percebe-se que os estudos de viabilidade econômica podem estimular os consumidores a utilizar tecnologias de transporte que podem ser abastecidas por recursos renováveis. Em trabalhos futuros, pretende-se expandir a análise considerando o abastecimento do carro elétrico através de outras tecnologias baseadas em recursos renováveis.

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Mais informações sobre os autores:

Renan Souza Moura, [email protected], Instituto Federal de Minas Gerais, Campus Formiga.
Cristian Adolfo Alvez, [email protected], Instituto Federal de Minas Gerais, Campus Formiga.
Lauriana Goulart Estevão, [email protected], engenheira eletricista, CREA-MG
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